Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 20/09/2013

Simbologia da Páscoa

 

   

"Não se menciona nos evangelhos o cordeiro na ceia preparada pelo Cristo, deste modo o próprio Jesus pôde se apresentar como o Cordeiro da reconciliação..."

        Ceia Ecológica, de Cerezo Barredo  

            O primeiro lugar sacro da liturgia é a casa, tida como "um santuário". Para o israelita, a casa era realmente um templo; a mesa familial era considerada um altar, as refeições como um rito sacro, e os pais como os celebrantes. É neste ambiente que se celebra a Páscoa (heb.: Pesah).          

           Convidar alguém para a própria mesa é sinal de paz, de confiança, de fraternidade, de perdão. Ainda muito antes de Cristo acrescentou-se às refeições, antes e depois, a oração. Participam da bênção os comensais, no começo, comendo a refeição e, ao seu final, bebendo do cálice, sempre precedido do Amen.

 

No antigo Israel

 

           Originariamente uma festa agrícola que durava sete dias, a Páscoa era uma festa pré-israelita da colheita da cevada, celebrada na primavera - em 14 de Nisan (Êx 12.6,8,18); mais tarde foi corrigido para 15 de Nisan (Lv 23.5-6; Nm 28.16-17).

           As festas dos Pães Ázimos (hag-Massot) e da Páscoa (Pesah-haggadah) serviam de comemoração dos atos salvíficos de Deus, tornando-se uma única festa quando os israelitas se estabeleceram em Canaan. Israel reinterpreta a Páscoa, que celebra a fecundidade dos rebanhos e dos campos maduros, de tradição canaanita, e estabelece que todo aquele que deixasse de celebrá-la seria excluído de seu povo (Nm 9.13).

           Na época do rei Josias as duas festas passaram a ser celebradas simultaneamente no mês de Abib (Êx 13.3-10; Dt 16.1-8; 15.20).

           O ritual é antigo, com descrição na terceira pessoa do plural: celebração na primavera, mandato de comer apressadamente, proibição de deixar restos de cordeiro assado, rito de sangue de proteção (Êx 12.3-11). Mais tarde é vinculada ao êxodo (Êx 12.12-14; 12.23) e se transforma em uma festa de peregrinação ao templo dentro da celebração dos Pães Ázimos. Nesse sentido, há uma medida política, pois evita reaproximações com o Egito (cf. Dt 16.1-8; 17.16).

 

No judaísmo antigo

 

           O judaísmo ortodoxo sistematizou as etapas do evento pascal. O dono da casa abençoa e distribui o vinho, ervas amargas, tortas sem fermento (heb.: massot, pão espremido; gr.: ázimo, pão sem fermento), cordeiro assado, ou também um cabrito, seguindo o ritual: a) bênção do vinho e bênção da festa; b) o chefe de família lava as mãos; c) come-se a salsa molhada no vinagre ou em água com sal; d) divide-se o pão ázimo pelo meio, uma parte para o começo e a outra para o fim da refeição; e) lê-se Deuteronômio 26.5-8, narração da saída do Egito; f) lava-se as mãos com bênção; g) bênção do pão ázimo antes de dividir entre os presentes; h) bênção das ervas amargas; i) carneiro, mistura-se as ervas com o pão ázimo - Êxodo 12.8; j) prepara-se a mesa, lembra-se a libertação do povo do Egito - Êxodo 12.26-27; k) come-se a porção do pão ázimo que foi guardada; l) bênção depois da refeição, comida e vinho; m) conclui-se com o Hallel, os Salmos 115 a 118 e 136; n) desejo final.

           Com isto, surgem quatro perguntas sobre o sinal festivo que requerem resposta. 1) Por que comer o cordeiro pascal? Porque o Santo passou (pasah) diante das casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu os egípcios, mas livrou as nossas casas (Êx 12.27); 2) Por que comer os pães ázimos? Porque nossos pais não tiveram tempo de deixar a massa fermentar (Êx 12.39); 3) Por que comer ervas amargas? Porque os egípcios amarguraram a vida de nossos pais no Egito (Êx 1.14); 4) Por que beber apoiados no cotovelo? Porque é nosso dever agradecer, louvar, celebrar, glorificar, exaltar, engrandecer aquele que fez por nossos pais e por nós grandes prodígios.

 

No cristianismo

 

           Nas comunidades cristãs primordiais, a Páscoa (gr.: Páscha) era experiência de fé decisiva de ruptura com o pecado (cf. 1Co 5.7-8). É pertinente a leitura do antigo credo cristão preservado em 1Coríntios 15.3-4.

           Biblicamente, Jesus Cristo foi preso na noite de quinta para sexta-feira, em seguida foi crucificado (Mt 27.62; Mc 15.42; Lc 23.54; Jo 19.31: dia de preparação e véspera do sábado, isto é, sexta-feira). Isto ganha importância pela ordem quanto à prisão de Jesus: "Não na festa, para que não haja tumulto entre o povo" (Mt 26.5; cf. Lc 22.6-7).

           Para João 18.28, a refeição pascal judaica foi realizada após a crucificação do Cristo. O apóstolo Paulo (1Co 11.23) soube que Jesus foi preso quando visitava Jerusalém vindo da Galiléia para a Páscoa. Nessa noite, rodeado de discípulas (cf. Mc 15.40-41) e discípulos, Jesus realizou sua última refeição. Está de acordo com Mc 14.22-25, que inclui o Hallel (Mc 14.26). Normalmente costumava-se tomar a refeição principal antes do pôr-do-sol; a ceia pascal era realizada à noite, dentro dos muros de Jerusalém.

           Não se menciona nos evangelhos o cordeiro na ceia preparada pelo Cristo, deste modo o próprio Jesus pôde se apresentar como o Cordeiro da reconciliação, como entendido pela Igreja (Jo 1.29; 1Co 5.7).

           A morte de Jesus foi interpretada pelas comunidades de fé como sacrifício pascal (1Co 5.7: "...pois também a nossa Páscoa foi imolada, Cristo."). É assim que reconhece também o quarto evangelista (Jo 19.31-36), pois, para ele, Jesus morreu na hora da imolação dos cordeiros pascais. E ressuscitou!

           Em síntese, celebrar a Páscoa significa afirmar que Jesus, o Cristo, venceu (pasah, "passar", "pular") a morte. É proclamação da história da nossa salvação.

 

João Batista Ribeiro Santos

Biblista e pastor da Igreja Metodista na 3ª Região Eclesiástica.

 

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