Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 20/09/2013
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Segunda-feira, 29 de janeiro de 2007 |
Recado às igrejas: falem mais alto
Por Edelberto Behs
NAIROBI, 29 de janeiro (ALC) - Na abertura do Fórum Social Mundial (FSM) 2007, reunido pela primeira vez na África, de 20 a 25 de janeiro, a co-presidente da organização Paz Mulher ao Redor do Mundo, Kamia Bhasan, carregava cartaz no qual se lia: "O sonho americano criou um pesadelo para muitos".
De certa forma, o cartaz da ativista indiana traduz o que sete edições do FSM vêm enfatizando na sua bandeira de lutas: os recursos naturais são limitados, os países credores não podem fazer da dívida externa dos países pobres a sua caderneta de poupança, sem uma justa distribuição da riqueza não haverá paz.
Essa bandeira de luta desdobra-se em muitas outras, todas relacionadas, de algum modo, ao mote maior: é impossível a paz sem a justiça, o que, aliás, é um princípio já definido no texto sagrado dos cristãos. A exploração de recursos naturais da África (por estrangeiros) e a falta de acesso à água pela população pobre do continente foram temas que apareceram em vários momentos do sétimo FSM.
Na própria capital do Quênia, 50 mil moradores de Nairobi, que deixaram de pagar suas contas nos últimos meses, correm o risco de ficar sem água, noticiou o jornal The Standard, da capital queniana, no dia 18 de janeiro, relata matéria da agência Carta Maior. O direito à água e à moradia justifica o slogan deste FSM reunido em terras africanas: "Lutas populares, alternativas populares".
O Fórum Urbano Mundial da Organização das Nações Unidas (ONU), reunido em 2002 também em Nairóbi, revelou dados alarmantes sobre a favelização na África. Na Etiópia, 99,4% da população urbana vivem na favela; na Tanzânia, esse percentual desce um pouco, para 92,1%, e para 85,7% no Sudão.
Taoufik Ben Abdalla, que integra o comitê organizador africano do FSM 2007, comentou para o jornal África Flame que apenas 50 dos 850 milhões de habitantes do continente africano são "cidadãos verdadeiros" com direitos básicos atendidos. Em Nairobi, 57% de sua população vivem com menos de um dólar por dia!
"Deus chora", disse o Prêmio Nobel da Paz, arcebispo anglicano Desmond Tutu, ao falar na Basílica Católica Romana da Sagrada Família de Nairobi aos participantes do Fórum Mundial de Teologia e Libertação, no sábado, 20. O arcebispo sul-africano enfatizou:
- Deus vê o que está acontecendo no Zimbábue, na Nigéria, na Etiópia, na Palestina, e Ele chora. Têm pessoas jogando comida fora e têm pessoas passando fome. Deus nos diz: por favor, ajudem-Me para que possamos ter um outro mundo, um mundo onde os ricos possam partilhar com os pobres e ajudar uns aos outros.
Tutu lembrou, ainda, de ditado africano, que diz: "Uma pessoa só é pessoa para outra pessoa". E emendou: "Nós precisamos de outros seres humanos para sermos humanos. Somos feitos para ser família. Nunca vamos ganhar a guerra contra o terror enquanto existirem pessoas desesperadas, doenças e pobreza", admoestou.
No seminário sobre a Dívida Ilegítima, a Prêmio Nobel da Paz 2004 e fundadora do movimento Cinturão Verde, a queniana Wangari Maathai, destacou que o pagamento de dívidas ainda é o maior obstáculo na África, Ásia e América Latina no combate à pobreza de suas populações.
"Nós devemos pedir aos governos dos países e às instituições financeiras internacionais para questionarem seus padrões de correção e justiça, e ver como é ilegítimo o encargo da dívida para os países pobres", destacou Maathai. "Eles sabiam que o povo não poderia pagar a dívida, que a paga, agora, com a sua vida", emendou.
Maathai lembrou, segundo a repórter Susanne Buchweitz, que milhões de pessoas estão morrendo porque não têm acesso a remédios e hospitais, pois os governos gastam os recursos no pagamento da dívida externa. A ativista queniana deixou um recado muito claro, dirigido às igrejas:
- As igrejas têm a autoridade moral e têm muitos membros, mas terão que falar mais alto.
Na abertura do FSM de 2007, o ex-presidente de Zâmbia, Kenneth Kaunda, destacou que na África, e em especial no Quênia, são as igrejas que ocupam o poder de mobilização popular, o que antes estava nas mãos dos movimentos de independência, relata matéria da agência Carta Maior.
Para o franciscano gaúcho Aldri Crocolin, que participou da sétima edição do FSM em Nairobi, se a igreja ficar ao lado dos pobres, ela recupera um papel que perdeu quando foi cooptada pelo Império Romano. "Nosso papel não é o de ficar fazendo belos cultos, mas, como disse Jesus, o de lutar para que todos tenham vida e a tenham em abundância".
Agora, será preciso escutar com atenção de quantos decibéis será o grito das igrejas nos tantos eventos articulados no sétimo FSM para o decorrer de 2007 em favor da vida, da paz e da justiça.
Fonte: Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação
Veja também: A participação das igrejas cristãs no evento. Matéria divulgada pela Agência Soma. CLIQUE AQUI