Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

Robótica

Fazei-o de todo o coração

A história do professor de robótica que, voluntário do Projeto Sombra e Água Fresca, está mudando a vida de adolescentes de Belo Horizonte por meio de um projeto de inclusão digital com lixo eletrônico

Sucatas que transformam vidas. Assim o jornal "Hoje em Dia", de Minas Gerais, destacou o trabalho realizado pelo professor de robótica Liberato Ferreira da Silva, membro da Igreja Metodista Central de Belo Horizonte. Ele utiliza impressoras quebradas, celulares descartados, videocassetes antigos, palitos de picolé e tampas de garrafa para a construção de robôs, rodas gigantes e carrinhos de controle remoto. Atividade de lazer? Muito mais do que isso. As aulas de robótica dadas voluntariamente no Projeto Sombra e Água Fresca do bairro São Gabriel, na periferia de Belo Horizonte, têm incentivado as crianças ao estudo, a conhecimentos específicos de matemática, física e geometria, ao trabalho em equipe e, sobretudo, proporcionado um olhar mais esperançoso sobre a própria vida. O sucesso do projeto acabou ganhando páginas na imprensa e um destaque especial no Portal do Professor, site do Ministério da Educação. Para o Expositor Cristão, o professor Liberato conta como desenvolve este projeto e, especialmente, o que o motiva.

Como iniciou o projeto de robótica?

Montei um laboratório de robótica no colégio metodista Izabela Hendrix, junto com Lúcia Leiga. Achamos que esse trabalho poderia ser feito no bairro, vinculado ao Projeto Sombra e Água Fresca. Há dois anos o trabalho começou a ser estruturado e há seis meses oferecemos as aulas de robótica para as crianças de São Gabriel. A robótica atrai as crianças para que elas tenham uma lição muito maior.
 

O que as crianças aprendem a partir da robótica?

Quando falamos em robótica, é comum se pensar em robôs humanóides. Na verdade, é possível fazer vários tipos de objetos: carros, helicópteros, rodas-gigantes etc. A partir dos projetos exploramos conhecimentos como matemática, física, geometria e até leitura, além da capacidade de diálogo e trabalho em equipe. Um dos meus alunos, em apenas seis meses participando do projeto tornou-se monitor em matemática da escola dele. Percebo que várias crianças têm limitações na coordenação motora, pois o ambiente não proporciona o desenvolvimento dessa habilidade. Elas também ganham em concentração e educação e estão melhorando suas notas na escola.

 

Onde o projeto está instalado?

Na Igreja Metodista Betânia, bairro da periferia de Belo Horizonte, uma área de risco. É um trabalho que integra a rede de projetos Sombra e Água Fresca. Temos hoje 30 crianças no projeto, em várias atividades, como artesanato, recreação, alimentação e educação cristã. A robótica é dada para um grupo de oito crianças em média toda quarta à tarde, das 14 às 17 horas, e aos sábados.

Como você arruma tempo para se dedicar ao serviço voluntário?

Tenho uma pequena empresa de desenvolvimento e projetos de robótica, mas gosto muito de dar aulas. Para me dedicar a este projeto no ano que passou, eu juntei um pequeno capital, abri mão de várias atividades e me dediquei praticamente 100% ao trabalho no Sombra e Água Fresca .

E como manter a disciplina e atenção das crianças?

Não é fácil. Às vezes, sobretudo quando está muito quente, é difícil obter a concentração. Mas, se eu conseguir que elas se concentrem por 20 minutos, já consigo muito. Elas são hiperativas. Entram e saem da aula o tempo todo, e você pode até achar que não estão aprendendo nada, mas elas aprendem. Você não pode contar com apenas um dia. Educação requer tempo. É um processo silencioso, não se pode esperar resultados imediatos. Ainda assim, o projeto teve um sucesso surpreendente. Foi interessante perceber o trabalho em equipe. Ninguém constrói nada sozinho. Cada um fez uma parte. O objeto de um sempre era acabado por outro. A princípio eles não gostavam muito desse revezamento. Mas então perceberam que o trabalho pertencia a todos. E, nesse processo, pude aplicar o conhecimento dos teóricos. Por exemplo, Piaget estimula a construção do conhecimento; Vigotski, o trabalho em equipe. Aprendemos juntos.

Como o projeto ganhou essa repercussão na imprensa?

Fiz contato com a imprensa local. Um jornalista se interessou pela história, pediu para entrevistar as crianças. E foi apenas quando elas deram as entrevistas que eu mesmo me dei conta de como elas haviam melhorado na escola, de como o projeto já havia dado frutos. Depois desta matéria, para o caderno de informática,também vieram reportagens para a TV, e a prefeitura de Belo Horizonte se interessou em desenvolver projeto semelhante em outras áreas.E toda essa atenção e valorização do trabalho contribuiu para a auto-estima dos alunos.

Quais são os seus planos para 2010?

Espero consolidar o projeto. As crianças ainda não viram computação, controle de automação, programação. Nós temos muito material que ainda não foi utilizado. Muita gente doa material. Trabalhamos com material simples, lixo eletrônico.

E o que você, como professor, tem aprendido com este projeto?

Estou ganhando em preparo pedagógico. Aprendendo a fazer a ponte para o espaço escolar. O que eu mais gostei no projeto é que a gente começou muito simples, num espaço difícil, até perigoso. Mas foi possível perceber que dá para se trabalhar educação em espaço não escolar de forma a contribuir com o espaço escolar e com a vida das crianças. Aquilo que você pega, aquilo que vem à sua mão, você deve fazer com toda a força. Por isso, jamais tratar este projeto como pequeno, mas como coisa de alto nível. Eu vejo cada aluno como único. Mesmo que eu tivesse 300 alunos, olharia para cada um como único, em suas potencialidades. É um princípio bíblico: o que você tem que fazer, faça bem feito. "Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração,como para o Senhor e não para homens..." (Colossenses 3.23) É este princípio que motiva nosso trabalho.

Construir sonhos e torná-los reais para nossas crianças e adolescentes e jovens, diz o professor Liberato (ao fundo)


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