Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

Palavra Episcopal junho 2008

 O tripé do discipulado Wesleyano

 

João Carlos Lopes - Bispo na 6ª Região Eclesiástica

O escritor quaker Elton Trueblod, falecido em 1994, fez a seguinte observação a respeito da igreja cristã: "talvez a maior fraqueza da igreja cristã contemporânea é que milhões dos seus supostos membros não estão de fato envolvidos. O que é pior, esses membros não pensam que isso seja estranho. Tão logo reconhecemos a intenção de Jesus de fazer de sua igreja uma companhia militante, percebemos imediatamente que o que convencionalmente entendemos por igreja, não é suficiente. Não existe chance real de vitória para uma companhia se noventa por cento dos seus soldados estão sem treinamento e não querem se envolver. E essa é, de fato, a nossa situação".

João Wesley disse: "A igreja não transforma o mundo fazendo novos convertidos. Ela transforma o mundo fazendo discípulos." A ordem de Jesus foi "Ide e fazei discípulos de todas as nações" Mt 28. E o fundamento do discipulado é o fato de que "aquele que diz estar nele, também deve andar como ele andou" I João 2.6.

Com base no ministério terreno de Jesus, João Wesley desenvolveu um plano simples para amadurecer e equipar os metodistas do seu tempo. Esse plano refletia as seguintes convicções básicas de João Wesley a respeito do discipulado:

1. Discipulado é necessário

João Wesley escreveu: "estou cada dia mais convencido de que o maior desejo do diabo é que em todos os lugares as pessoas sejam apenas semi-despertas e que depois sejam abandonadas e voltem a adormecer novamente".

Wesley estava convencido de que as pessoas despertas pela pregação pública do evangelho precisavam ser envolvidas num processo contínuo de confissão de pecados; arrependimento; prestação de contas e santificação.

2. Na dinâmica do discipulado, pequenos grupos são necessários

Em 1743 Wesley organizou a sociedade. "Tal sociedade é nada mais do que uma companhia de homens tendo a forma e buscando o poder da piedade, unidos a fim de orar juntos, receber a palavra de exortação e cuidar uns dos outros em amor, para que possam se ajudar mutuamente no desenvolvimento da sua salvação".

Discipulado era a chave para esse nível de vida em santidade. Assim Wesley criou seu tripé para o desenvolvimento da dinâmica do discipulado: a) Sociedade; b) Classes e c) Bands.

a) Sociedade (as multidões)

O propósito da sociedade era gerar mudança no nível do conhecimento e reunia pessoas de uma área geográfica específica. Esse grupo maior de pessoas se reunia uma vez por semana para orar, cantar, estudar a bíblia e cuidar uns dos outros em amor. Havia pouca provisão para resposta pessoal e prestação de contas. Como vimos acima, João Wesley descreveu a sociedade como "uma companhia de pessoas tendo a forma e buscando o poder da piedade". Era uma reunião muito parecida com os cultos dominicais em nossas igrejas hoje.

b) Classes (os 12 discípulos de Jesus)

O propósito das classes era gerar mudança de comportamento. As classes refletiam a estrutura mais básica da sociedade. Cada classe era composta de 12 a 20 membros, de ambos os sexos, com variedade de idade e classe social, sob a direção de um líder treinado.

Não eram encontros para aprendizado acadêmico. Reuniam-se semanalmente, à noite, para confissão mútua dos pecados e prestação de contas para crescimento em santidade.

As classes providenciavam a estrutura para a "inspeção das condições do rebanho"; para ajudar as pessoas nas suas lutas e tentações e para ajudá-las a entender melhor, em termos práticos, as mensagens que haviam ouvido nas reuniões da sociedade.

Para continuar na sociedade, era necessário pertencer a uma classe. Em 1742, numa sociedade em Londres havia 426 membros, divididos em 65 classes. Dezoito meses mais tarde, aquela mesma sociedade tinha 2.200 membros, todos envolvidos em uma classe. Toda semana cada membro da classe tinha o dever de falar aberta e honestamente a respeito da "situação da sua alma".

c) "Bands" (semelhante aos três discípulos mais próximos de Jesus: Pedro, Tiago e João):

O propósito das "bands" era gerar mudança de direção, coração e posição. Uma "band" era composta de 4 membros, do mesmo sexo, aproximadamente da mesma idade e estado civil. Eram células voluntárias com  pessoas que tinham um compromisso claro e que desejavam crescer em amor; santidade e pureza de intenção. O ambiente nas "bands" era de completa honestidade e franqueza.

Havia regras sobre pontualidade e ordem nos encontros. Perguntas específicas foram introduzidas para que semanalmente cada membro respondesse aberta e honestamente:

Que pecado conhecido você cometeu desde a nossa última reunião?

Que tentações você encontrou?

Como você foi liberto delas?

Você pensou, disse ou fez qualquer coisa que tem dúvida se é pecado ou não?

Há qualquer coisa que você tem o desejo de manter em segredo?

Podemos notar que nas "bands" não havia espaço para fingimento. Ali havia compromisso de confidencialidade e mútua submissão. Era um "centro de treinamento" para futuros líderes.

3. Na dinâmica do discipulado, líderes são necessários:

Num modelo como esse, a necessidade de líderes é grande. João Wesley treinou e mobilizou um grande número de líderes. Eram homens e mulheres, barbeiros, ferreiros, padeiros, donas de casa. E a descrição da função daqueles que cuidavam das sociedades e das classes era muito simples: "pregue; ensine; estude; viaje; reúna-se com as sociedades, classes e bands, exercite-se diariamente e alimente-se moderadamente".

4. O alvo do discipulado é uma vida de santidade e serviço a Deus e ao próximo:

O alvo a partir do qual todo o processo deveria ser constantemente avaliado era: santidade e boa vontade - espiritualidade e serviço. Essa dinâmica produziu um novo tipo de cidadão e cidadã, num período da história da Inglaterra em que a criminalidade e toda forma de pecado público crescia vertiginosamente. Esses homens e mulheres foram instrumentos de Deus na reforma tanto da igreja como da sociedade na qual viveram.

5. Conclusão:

De acordo com a narrativa dos evangelhos, Jesus ministrou às multidões 17 vezes. Entretanto, há aproximadamente 46 menções nos evangelhos de que ele gastou seu tempo em particular com os seus discípulos. Naqueles grupos menores ele os treinou para o ministério.

"Ide e fazer discípulos (...) Ensinando-os a guardar (obedecer)". Não é possível fazer discípulos e discípulas sem treinamento. E não pode haver treinamento sem prestação de conta.

Então:

Façamos dos pequenos grupos uma prioridade na nossa missão de fazer discípulos e discípulas;

Envolvamo-nos consistentemente na tarefa de treinar outros para também fazerem discípulos e discípulas;

Lembremo-nos da nossa história e sigamos o testemunho e o exemplo daqueles e daquelas que nos antecederam nessa abençoada tarefa de fazer discípulos e discípulas;

Renovemos nosso compromisso com o evangelismo, reconhecendo que, acima de tudo, evangelizar é fazer discípulos e discípulas.


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