Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 20/09/2013

Palavra Episcopal fevereiro 2007

 

João Carlos Lopes, Bispo da 6ª Região Eclesiástica

"A igreja é cheia de hipócritas". "Não praticam o que pregam". Já ouviu frases como estas? Obviamente algumas pessoas usam-nas para justificar sua falta de compromisso. Mas o fato é que há um elemento de verdade nessas afirmações. Existem hipócritas na igreja. Há pessoas que não praticam o que pregam. E alguns mostram, pela sua infidelidade, que o que dizem crer não tem muito valor.

A Igreja deve ser um lugar onde as pessoas possam ver a fé em ação. Onde demonstrações vivas da graça de Deus sejam percebidas.

Nos primeiros versículos de Romanos 12, o apóstolo Paulo havia explicado que a igreja é um corpo com multiplicidade de membros e multiplicidade de dons. Nesse corpo cada membro é necessário e tem o dever de exercitar os dons e ministérios que Deus lhe deu. Agora, nos versículos 9-13 o apóstolo mostra como a graça de Deus afeta o dia-a-dia do/a cristão/ã. A mensagem aqui é que não apenas temos a responsabilidade de exercitar os dons, mas temos também a responsabilidade de exercitar a graça.

A graça de Deus, estendida a nós, deve ser ministrada através de nós a outras pessoas. Paulo demonstra como o exercício da graça de Deus afeta o nosso viver e, conseqüentemente, o nosso testemunho. Vejamos:

1. O exercício da graça de Deus afeta o nosso caráter:

"O amor seja sem hipocrisia. Detestai o mal, apegando-vos ao bem" (v.9).

A palavra "hipocrisia" é a mesma palavra (no original) usada para atores e atrizes. Significava "fazer um papel; simular; fingir". Paulo está dizendo que o amor precisa ser sem fingimento.

A seguir o apóstolo orienta: "detestai o mal, apegando-vos ao bem". Será que isso não quer dizer que o verdadeiro amor rejeita o pecado (mal), mas acolhe as pessoas (bem)? Freqüentemente caímos em um desses extremos: ou rejeitamos a pessoa por causa do pecado ou ignoramos o pecado com medo de ferir a pessoa. O verdadeiro amor ama a pessoa enquanto despreza o pecado. Amor sem verdade é leviandade. Verdade sem amor é legalismo. Precisamos amar as pessoas como elas são, ao mesmo tempo em que reafirmamos a verdade, buscando ajudá-las na busca da transformação pela graça de Deus.

2. O exercício da graça de Deus afeta os nossos contatos:

"Amai-vos cordialmente, uns aos outros, com amor fraternal, preferindo-vos em honra uns aos outros" (v.10).

Paulo relembra os romanos que eles são parte da família de Deus. Esse relacionamento fraterno é a base do compromisso entre eles.

A última parte do verso nos dá a chave para o encorajamento mútuo: "preferindo-vos em honra uns aos outros". Quando exercitamos a graça de Deus nos nossos relacionamentos, reconhecemos que o/a outro/a é maior que nós. Essa é a mesma exortação que encontramos em Filipenses 2.3: "Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas em humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo". Um dos resultados práticos do exercício da graça de Deus no corpo de Cristo é que ficamos ansiosos por nos edificarmos mutuamente em amor.

3. O exercício da graça de Deus afeta o nosso comportamento:

"No zelo, não sejais remissos; sede fervorosos de espírito, servindo ao Senhor. Regozijai-vos na esperança, sede pacientes na tribulação, na oração, perseverantes" (v.11-12)

A ênfase do verso 11 é na intensidade com que vivemos nossa vida. O/a cristão/ã não pode ser indiferente ou apático/a. Uma das marcas da pessoa cristã é o entusiasmo. O serviço cristão deve ser realizado com fervor espiritual. Um espírito fervoroso é contagiante. A expressão "cristão apático" é uma contradição de termos.

Já o verso 12 enfatiza a influência da fé no comportamento: a) Regozijamo-nos na esperança quando nossa esperança é baseada na nossa fé em Jesus Cristo; b) Temos paciência na tribulação quando sabemos que Deus está conosco no meio das dificuldades; c) Perseveramos na oração quando cremos que existe um Deus que responde às nossas orações.

Quando exercitamos a esperança, outros/as serão encorajados/as a esperar. Quando somos pacientes na tribulação, outros/as serão motivados/as a fazer o mesmo. Quando perseveramos na oração, outros/as serão inspirados/as a perseverar. Assim a graça de Deus flui através de nós em direção aos/às outros/as.

4. O exercício da graça de Deus afeta o nosso cuidado:

"Compartilhai as necessidades dos santos; praticai a hospitalidade" (v.13).

O exercício da graça de Deus requer um cuidado genuíno para com as pessoas em necessidade: "aquele que possuir recursos deste mundo, e vir o seu irmão padecer necessidade, e fechar-lhe o seu coração, como pode permanecer nele o amor de Deus? Filhinhos, não amemos de palavra nem de língua, mas de fato e de verdade" (I Jo 3.17-18). No exercício da graça de Deus o egoísmo dá lugar ao altruísmo.

Conclusão

Estamos vivendo num tempo de intenso legalismo e intolerância. O fundamento da fé cristã, entretanto, é a graça de Deus: "pela graça sois salvos...". Alguém disse que "Deus não nos muda para então nos amar. Ele nos ama para então nos transformar".

Assim, no início de um novo período eclesiástico, diante de nós se renova o desafio evangélico de responder à graça de Deus de tal forma que possamos exercitá-la no nosso dia-a-dia, sendo transformados e sendo instrumentos de transformação na vida de todos/as aqueles/as que nos rodeiam, na igreja e fora dela.


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