Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 17/07/2012
Missionário metodista no Peru relata experiência vivenciada nas terras andinas
Servir a Deus no Canadá! Essa era a impressão do pastor metodista que está há um ano e meio no Peru. O casal de missionários cedidos pela Sexta Região Eclesiástica, Rev. Luciano Pereira da Silva (ao centro na foto acima de blusa preta), e sua esposa, Shirley da Silva Rocha, têm sido instrumentos nas mãos de Deus para o avanço do discipulado nas terras andinas. Na entrevista abaixo, o pastor conta a experiência com o discipulado, grupos familiares e como é discipular povos de outra cultura.
Quanto tempo você e a família têm de experiência com o discipulado?
Estamos trabalhando com discipulado desde nossa primeira nomeação em 1999. Tínhamos como base os grupos familiares. Minha primeira nomeação foi realmente algo inusitado, pois regressei para minha cidade natal, para a Igreja onde tive minha experiência com Cristo, a Igreja Metodista de Cambará. Ali comecei grupos familiares nas casas em um bairro da cidade com pessoas humildes, foi uma benção, pois alcançamos várias vidas para Cristo.
Depois de três anos ali fomos nomeados para Ibaiti, uma igreja maior, com um sonho de construir um novo templo. Neste tempo a Sexta Região tinha como meta o discipulado como se vê hoje. Começamos a desenvolver as células, os encontros, e vimos realmente muitas pessoas se achegarem a Cristo e tornarem-se discípulas/os de Cristo, pessoas que estão hoje na liderança da Igreja.
Durante os três anos vimos o início da realização do sonho da construção do novo Templo, até o tempo que permanecemos conseguimos ver o término da nave muito bonita e com muito espaço. Minha ultima nomeação na sexta foi na Igreja Metodista de Laranjeiras do Sul do Paraná.
Com foi a caminhada em Laranjeiras?
Quando cheguei à Igreja realmente me senti derrotado, pois era um tempo difícil, meu filho havia nascido com problemas de saúde, estava internado, depois de alguns meses veio a falecer. Na Igreja havia pessoas muito carinhosas e amáveis, mas necessitavam de um revigoramento. Tudo parecia contrário. Começamos um trabalho com grupos pequenos, discipulando, ministrando, orando e enfim a igreja foi reagindo.
Era uma igreja de poucas pessoas, com o trabalho de discipulado os frutos foram aparecendo, multiplicando e a igreja foi mudou sua condição, ao ponto de mudarmos para um novo salão no centro da cidade e, consequentemente, com o trabalho e dedicação dos irmãos/ãs, durante os quatro anos abrimos dois pontos missionários. Graças a Deus que Igreja segue crescendo naquele lugar. Glória Deus, pois Ele é quem dá o crescimento.
Desde quando está trabalhando no Peru? Como sentiu que Deus o estava enviando para outro país?
Na verdade desde quando fui chamado para o ministério pastoral eu tinha em meu coração que algum dia eu iria para outro país. Mas não tinha isso muito claro, sabia que o Senhor iria abrir as portas e as coisas iriam acontecer naturalmente se aquele sentimento era algo real. Até outro dia minha esposa lembrou que quando a conheci há 17 anos, eu havia dito a ela que um dia iria fazer missão no Equador. Quando surgiu o convite do Bispo Cevallos, ela então me fez recordar desse fato. Foi realmente emocionante ver o que Deus faz e como são seus planos.
Até 2010 eu estava convicto que iria para o Canadá, mas na última hora o Senhor fechou as portas, e alguns meses depois surgiu o convite do Bispo João Carlos para vir para o Peru. Conversei com minha esposa e lhe perguntei o que ela achava, ela respondeu de uma forma tremenda e impossível de negar que era o Senhor que estava atuando. Ela disse o que Jesus faria? Eu então disse vamos fazer nossas malas.
Então viemos para o Peru no começo de 2011, e começamos um trabalho em Lima e Callao, mas o Senhor foi abrindo as portas através de convites para ir para as províncias, interior do Peru. E fui assim obedecendo à voz do Espirito, e nestas visitas as regiões andinas, fui descobrindo coisas que realmente não tinha ideia que existia, pessoas, culturas, costumes tão diferentes dos nossos, que parecia impossível que alguém pudesse viver daquela forma, comer daquela forma, vestir-se em pleno século 21 daquela forma.
Isso tudo tem me ajudado a entender melhor o ser humano e perceber como muitas vezes somos limitados em nossa cosmovisão. Nestas viagens o Senhor nos fez sentar com eles, comer e pregar para eles. Também nos deu o privilegio de orar e demonstrar a eles que Deus não os esqueceu.
Você e a família já sabiam que iriam trabalhar com o discipulado no Peru?
O bispo João Carlos e uma comitiva de pastores e irmãos da Sexta Região vieram visitar o Peru e fazer um encontro nacional de discipulado, isto a convite do Bispo Jorge Bravo da Igreja Metodista do Peru. Eu não estava nesta comitiva, então pensei que não era para eu estar neste lugar, mas quando o bispo João Carlos voltou deste encontro, disse que eu seria o pastor para este trabalho. De fato, o trabalho aqui no Peru vai muito além do que entendemos por discipulado, aliás acredito que aqui podemos viver o que é verdadeiramente o discipulado.
Como é trabalhar o discipulado em outros povos, outra cultura?
Creio que o discipulado em culturas como encontradas neste país de tantas histórias, é a algo realmente fascinante. Pois aqui os métodos, as formas, a linguagem que conhecemos e aplicamos em nossa própria cultura não funciona. O desafio é buscar dentro da realidade deles suas próprias formas e a partir delas aplicar a visão do discipulado. Por outro lado, tenho aprendido que só existe uma linguagem que é aplicável em qualquer cultura e povo, que é exatamente a linguagem do amor. Quando demonstramos amor por eles, interessando-se, comendo sua comida, realmente isso é aplicável e eficaz. A partir disso, eles passam a te respeitar e ouvir o que você tem a dizer, assim tenho experimentado onde tenho ido.
Como são os Quéchuas e Aymaras que vivem nas regiões andinas?
Eles comentam que muitos dos próprios peruanos não se aproximam e não os valorizam como deveriam. Realmente este é um problema social dentro do país, os próprios peruanos são discriminados entre si. Há entre eles estas feridas, e em uma análise bem simplista, o terrorismo no Peru justamente nasce dessa revolta dos provincianos contra o sistema que não os valorizava, sendo que os maiores e melhores investimentos ficavam sempre na capital.
Nota-se entre as pessoas das províncias um complexo de inferioridade muito grande. Todos esses problemas estão refletidos nas comunidades cristãs metodistas, que estão espalhas pelas regiões andinas. Encontramos também entre eles uma linguagem extremamente mística, a folha sagrada da coca, os rituais de curas, os restos de influências do império Inka e culturas pré-inkas.
Como é lidar com a mística do sagrado no ponto de vista andino?
A mística que está em torno das montanhas, tudo isso realmente não aceita uma resposta teológica muito intelectualizada e acadêmica. Sem esquecer a influência do catolicismo, suas crenças e dógmas que também estão cravados e mesclados como um grande sincretismo religioso. Neste sentido, é necessário aproveitar o grande temor e respeito pelo sagrado e mostrar na bíblia sua mística e suas formas ensinadas nos evangelhos sem ferir a essência da cultura, ao mesmo tempo aplicando os princípios ensinados por Cristo.
Há diferença no tratamento das mulheres pelos homens?
Nota-se entre eles o machismo e por vezes a violência contra a mulher, isto ainda é tão visto, que muitas mulheres não falam o espanhol somente sua língua nativa. Pelo simples fato de muitos destes povos não serem considerados e valorizados de forma igualitária, a violência contra a mulher, é muito comum na região. Outro ponto muito marcado é sua forma de vida, sua higiene, suas formas de comer e sua língua. Tudo isso encontramos diferenças gritantes dentro do próprio Peru, o que dificulta ainda mais quanto mais para nós brasileiros.
Compartilhe um pouco sobre grupos pequenos.
Os grupos pequenos, discipulado de casa em casa, creio ser muito provável a eficácia, pois mantém dentro de sua cultura tribal esta qualidade de ser uma comunidade unida, de partilharem a comida, etc... Outro ponto interessante é o respeito que sentimos por líderes religiosos, isso bem aproveitado e com honestidade é uma benção, digo isso porque também há muitos lideres religiosos que aproveitam da ingenuidade e respeito deles para seus próprios benefícios. Por isso, a necessidade da Igreja Metodista trabalhar com esta gente que tanto necessita.
Os ritmos também precisam ser valorizados. Segundo testemunho deles próprios, algumas igrejas e missionários quiseram condenar seus estilos musicais como demoníacos, o que causou problemas na evangelização.
O que é muito interessante são as músicas evangélicas com ritmos da própria serra, isso tem uma grande aceitação entre eles. Fazer missão nestas etnias tão diferentes é uma aula de cultura e história, nunca pensei que países tão próximos do nosso tivessem tantas diferenças.
Como surgiu a parceria de desenvolver o discipulado no Equador?
De fato, quando cheguei aqui no Peru nossa designação era para Lima e Callao, como mencionei anteriormente. Pensava que trabalharia com a Igreja Metodista da capital e nada mais. No entanto, o Senhor tinha já traçado algo maior, é obvio que isso não aconteceria de qualquer forma, foi necessário a disposição de ir a estes lugares distantes.
A oportunidade de conhecer e alcançar outras nações como, Peru e Equador e outras que possivelmente virão é algo maravilhoso. Essa parceria com o Equador nasceu de uma amizade com uma jovem metodista equatoriana que foi fazer um treinamento missionário em Huancayo, no Peru, onde também participei com minha família. Ali falamos para ela da visão do discipulado e do trabalho que estávamos recém começando no Peru.
Terminado o encontro esta jovem veio para Lima, e ao necessitar de um lugar para ficar até o dia de seu retorno para o Equador, a convidamos para ficar em nossa casa em Lima. Ela muito interessada em ajudar sua igreja e seu país, comentou com alguns pastores, que se comunicaram conosco e programaram para participar de um encontro de discipulado em Lima. O desejo deles de que viajássemos a Quito, Equador, para apresentar a visão para os demais lideres e pastores daquele país foi muito intenso. Fomos e começamos a estabelecer este processo desta parceria e seguir na implantação deste projeto na Igreja Metodista do Equador, que graças a Deus conta com todo apoio e visão do bispo Cevallos.
Por fim, qual a sensação de cumprir o Ide de Jesus de ser testemunha e fazer discípulos/as desde Samaria, Jerusalém, Equador, Peru e por onde Deus o enviar?
Eu realmente tinha isso no meu coração, que alcançaria outros países, mas era algo que não comentava com muita gente. Muitos disseram, você pode fazer a missão aqui mesmo no Brasil onde você está? Porque sair tão longe? Correr tantos riscos? Nossa família também questionou bastante, isto por sentir de irmos para longe. De fato é uma alegria poder obedecer à vontade de Deus, de fazer o que Ele quer. Muitas vezes pensamos somente na comodidade, nos lugares de conforto e temos medo de renunciar para agradar a Deus. Creio que Deus só pode usar e realizar sua vontade plena quando de fato entregamos nossa vida totalmente para sua missão.
Eu tinha muitos motivos humanos para não obedecer, tenho uma filha que é especial, que necessita sempre de uma atenção diferenciada. Mas eu não posso em nenhum momento reclamar ou murmurar, pois em todos os momentos difíceis, o Senhor tem sido fiel e aberto portas onde realmente não existia nada. Isso eu entendo que só pode acontecer quando estamos no centro da vontade do Senhor, se isso serve de incentivo para quem está em dúvida com relação à fidelidade de Deus, de fato não é possível duvidar que o Supremo Pastor é Fiel.
Quando negamos nossos gostos pessoais, a fim de agradar a vontade daquele que nos alistou, que temos uma visão não centrada no prazer, mas centrada no ser uma nova criatura e realizar os sonhos de Deus. Seguramente, sem dúvida como diz o próprio Senhor Ele vai acrescentar o que é de nossa necessidade. Tenho provado a provisão do Senhor em todos os aspectos, isso não exclui que passamos por desânimo, vontade de desistir, mas em meio a todo isso sempre notamos claramente a mão do Senhor sustentando.
Rev. José Geraldo Magalhães - Assessoria de Comunicação da Igreja Metodista