Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013
metodismo na amazonia
Igreja Metodista Episcopal do Pará, 1ª igreja protestante da Amazônia
Rev. Justus Nelson e esposa Fannie Nelson Belém, 1920 Foto inédita no Brasil Cedida ao GEMA, Grupo de Estudos da Amazônia, pelo seu bisneto Brian Holden
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Neste 1º de julho de 2008 comemoramos 125 anos de fundação da Igreja Metodista Episcopal do Pará (1883), a primeira igreja protestante organizada na Amazônia, localizada na cidade de Belém do Pará.
É importante lembrar que a missão na Amazônia já estava no coração do metodismo desde 1835. Os primeiros passos devem-se ao pastor Daniel Parrish Kidder que esteve em Belém durante o período conturbado da Cabanagem[1], assistindo a Sociedade Americana dos Marítimos. A vinda de Kidder a Belém como "primeira tentativa de penetração do protestantismo na Amazônia"[2]. No entanto, a morte precoce de sua esposa o forçou a retornar aos EUA em 1839.~
Somente a partir de 1880 é que veremos um trabalho missionário metodista mais consubstanciado. Em 16 de junho daquele ano, o Rev. Justus Nelson, sua esposa Fannie Nelson e o missionário William Taylor chegam a bordo do Vapor Colorado no Porto de Belém.
O Rev. Justus Nelson, veio ao Brasil como missionário da Igreja Metodista Episcopal, norte dos EUA. A missão era de sustento próprio, logo tratou de trabalhar ministrando aulas de inglês nos dias úteis e cultos aos domingos. No dia 27 de junho de 1880, num armazém subalugado, ele celebrou o primeiro culto, ainda em inglês.
Já em janeiro de 1881, abriu uma escola metodista chamada "Colégio Americano". Contudo, em dezembro de 1882, após a epidemia de febre amarela que matou seu irmão John Nelson, sua cunhada que era casada com o outro irmão e a professora Hattie Bacheldar, o Colégio foi fechado. Justus Nelson, então, foi trabalhar como empregado numa loja comercial.
Mas estas dificuldades não apagaram a chama missionária da família Nelson. Ainda no final de 1882, o pastor Justus Nelson foi convidado para pregar o Evangelho em português na casa de Justiniano Rabelo Carvalho, na Rua do Rosário, nº 40. E como o espaço ficou pequeno, o culto semanal passou a ser realizado numa casa situada na Av. 29 de Agosto, nº 68, hoje, Av. Assis de Vasconcelos. Foi nesta casa que o povo chamado metodista da Amazônia fundou a Igreja Metodista Episcopal do Pará, testemunhando os desafios do Evangelho nas calorosas terras paraenses.
O Brasil era Imperial, tendo como religião oficial a Católica Romana, o que gerava muita perseguição ao povo metodista. O quadro de perseguição se agravava por Justus Nelson não se omitir do mundo político de sua época, defendendo ideais liberais e republicanos. Defendia a laicidade do Estado, liberdade religiosa, liberdade de imprensa e a ampliação da participação dos indivíduos na esfera pública. Num dado momento ele diz enfaticamente que "segundo nosso parecer, a república é a forma de governo que melhor conserva os direitos do maior número de cidadãos, ou, por outros, que mais chegada é aos princípios da religião cristã [...] Procuraremos, portanto apurar a consciência e despertar convicções firmes, sem as quais a república vindoura do Brasil não poderá ser feliz"[3].
Eleito superintendente do Distrito Brasil, que incluía as missões metodistas do Pará, Pernambuco e Amazonas, Justus Nelson lançou a semente do Evangelho nas cidades de Benevides/PA, Santarém/PA e Manaus/AM. Tudo independente financeiramente da Igreja norte-americana e da tesouraria da Igreja local. Em sua despedida, falando sobre a missão de sustento próprio, ele diria "da mesma maneira que Paulo em Corinto, eu no Pará, nunca recebi remuneração do meu serviço de pastor [...] Como não temos membros endinheirados na igreja, durante estes últimos anos a maior parte das reduzidas despesas da nossa igreja é paga com dinheiro meu, ganho por mim nas aulas de línguas [...] Alegremente prefiro ser livre e independentemente escravo de todos"[4].
Em 1890, o aquecimento econômico advindo do comércio da borracha e a abertura política conseqüente à Proclamação da República corroboraram terminantemente para o intenso movimento tipográfico observado no Estado. Sendo que neste bojo, no dia 04 de janeiro daquele ano, surge um dos maiores legados do pioneirismo metodista na Região: o jornal O Apologista Christão Brazileiro, "jornal religioso semanal para famílias, dedicado à propaganda da verdade evangélica", o lema era "saibamos e pratiquemos a verdade, custe o que custar". |
O jornal O Apologista Christão Brazileiro começou com uma periodicidade semanal e assim permaneceu de janeiro de 1890 até julho de 1891, período de maior fôlego do editorial, perfazendo em torno de setenta e seis edições. De agosto de 1891 até janeiro de 1892, o jornal passou a ser impresso quinzenalmente. A partir de fevereiro de 1892 até setembro de 1910, o jornal circulou mensalmente, sendo a cobertura de novembro a dezembro deste ano reunida num único número. Houve uma interrupção de sua publicação em 1910. Somente em 1925, ano de despedida da família Nelson de Belém, sairia a derradeira edição d?O Apologista, numa espécie de resumo de toda as obras empreendidas ao longo as mais de quatro décadas de missão na Amazônia.
Com o intuito de estudar sobre estas histórias que revelam os desafios enfrentados pelos nossos pioneiros e refletir sobre as interrupções e sucessos da dinâmica missionária da Igreja Metodista na Amazônia, em 2003 (300 anos de nascimento de João Wesley), nasceu o Grupo de Estudos do Metodismo na Amazônia - GEMA. E de acordo com recentes pesquisas do Grupo, entre vários achados, descobriu-se uma informação muito importante que contraria inclusive os relatos oficiais da Igreja Metodista sobre sua história no Brasil.
No site da Igreja, na seção sobre história do metodismo, encontramos uma vaga "lembrança" sobre o metodismo na Amazônia. No texto temos a nota equivocada que diz que Justus Nelson morreu e está sepultado em Belém. O correto é que, após 45 anos de incansável dedicação e paixão missionária, Justus Nelson, aos 75 anos de idade, partiu de Belém no dia 08 de novembro de 1925, devido à crise da economia da borracha que assolou a cidade. Antes da partida Jusuts escreveu "se a Igreja Metodista Episcopal, nestes 45 anos no Brasil, conseguiu atrair algumas pessoas a uma vida limpa por mais diminuto que seja o número, fica plenamente justificado o dispêndio aqui feito, de dinheiro, de trabalho e de vidas preciosas ceifadas no seu vigor"[5]. Com o fechamento da missão, os irmãos e as irmãs metodistas de Belém foram encominhados/as para outras igrejas evangélicas. Justus trabalhou em Portland, Oregon/EUA, produzindo jornais e pregando em língua portuguesa para brasileiros que viviam naquela cidade.
Ainda merece destaque nessa história do metodismo na Amazônia o período de quatro meses (janeiro a abril de 1893) que O Apologista Christão Brazileiro não foi publicado devido à prisão de Justus Nelson no Presídio São José (hoje, um Pólo Turístico), acusado de "ultraje à religião Católica", art. 185 do Código Penal da República. Durante as pesquisas empreendidas pelo GEMA, foi encontrado no Arquivo Público do Pará o auto de soltura de sua prisão, datado em 08 de abril de 1893.
Até os dias de hoje, um dos poucos documentos que tínhamos sobre o Apologista era uma compilação da última edição do jornal, realizada pelo professor Duncan Reily, intitulada Metodismo na Amazônia. Esta obra é uma transcrição de um microfilme dos arquivos da Board of Global Ministries of the United Methodist Church, de Nova York. O GEMA obteve acesso aos originais do jornal que estão integralmente "microfilmados" na Biblioteca Pública Arthur Vianna, agora trabalha na divulgação desta riquíssima fonte da história do metodismo no Brasil, especificamente na Amazônia.
GEMA - Grupo de Estudos do Metodismo na Amazônia: Aluízio Laurindo Júnior, Antônio Carlos Soares dos Santos, Cláudio Augusto Lima das Neves, Fabrício Matheus, Flávio Elias Quemel, Franklim Ferreira Sodré, Saulo Baptista, Tony Vilhena.
[1] Revolta na qual negros e índios se insurgiram contra a elite política e tomaram o poder no Pará. Entre as causas da revolta encontram-se a extrema pobreza das populações ribeirinhas e a irrelevância política à qual a província foi relegada após a independência do Brasil.
[2] DREHER, Martin. História do protestantismo na Amazônia até 1980. In: HOORNAERT, Eduardo. História da igreja na Amazônia. Petrópolis: Vozes, 1992. p. 323.
[3] O Apologista Christão Brazileiro, Ano I, nº 1. Belém, 04 jan. 1890. p. 1.
[4] Reily, Duncan. Metodismo na Amazônia. São Bernardo do Campo: IMES, 1982. p. 20.
[5] Ibidem, p. 23.