Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

João Cândido: o Almirante negro metodista

Salve o almirante negro, que tem por monumento, as pedras pisadas do cais.... Assim dizia a música de João Bosco e Aldir Blanc. Hoje, o marinheiro João Cândido Felisberto (1880-1969), o "almirante negro", líder da Revolta da Chibata, tem também um monumento feito de bronze. A estátua de três metros de altura em sua homenagem foi inaugurada no dia 22 de dezembro do 2007 em frente à Baía de Guanabara onde, há quase 100 anos, João Cândido liderou uma revolta de marinheiros contra os castigos corporais impostos pelos oficiais da Marinha.

O estopim da revolta, no dia 22 de novembro de 1910, foi o castigo de 250 chibatadas imposto ao marinheiro Marcelino Rodrigues diante da tripulação do encouraçado Minas Gerais. Mais de dois mil marinheiros, liderados por João Cândido, tomaram à força quatro navios de guerra na baía de Guanabara e chegaram a bombardear a então capital federal. Como resultado, a Marinha aprisionou centenas de revoltosos. Muitos foram fuzilados, outros deixados na floresta amazônica para trabalho forçado. Mas a Revolta atingiu seu objetivo: foi abolido o uso da chibata como norma de punição disciplinar na Marinha.Segundo o historiador Marco Morel, o movimento serviu como "um golpe de misericórdia nos resquícios de escravidão que ainda permaneciam arraigados na sociedade".

 

 

Foto: ArquivoNacional_Correio_da_Manhã 

João Cândido em foto de 1963.

 João Cândido também sofreu prisão e maus tratos. Expulso da Marinha, morreu na miséria, sem patente ou aposentadoria. Anos antes de sua morte, porém, teve um importante encontro: com Deus. Aceitou a Jesus na Igreja Metodista de Jardim América, Rio de Janeiro, e frequentou a Igreja Metodista de São João de Meriti-RJ. Quando faleceu, no dia 06 de novembro de 1969 na cidade do Rio de Janeiro, aos 89 anos de idade, teve o ofício fúnebre sendo realizado pelo pastor metodista Lucas Mazon.

 

Pouca gente sabe deste episódio da vida de João Cândido. Na verdade, pouca gente conhece este personagem de nossa história, mesmo na Igreja Metodista. Durante muitos anos, o nome do marinheiro negro João Cândido (o título de "almirante" foi uma homenagem popular, ele nunca recebeu essa patente) foi considerado uma afronta às Forças Armadas e uma ameaça à ordem e progresso do país. A letra da música Mestre Sala dos Mares, que tinha como título original Almirante Negro, foi censurada durante os anos da ditadura militar. Sobre a censura à música, o compositor Aldir Blanc conta (em www.dhnet.org.br):

 

"Minha última ida ao Departamento de Censura, então funcionando no Palácio do Catete, me marcou profundamente. Um sujeito, bancando o durão, (...) mãos na cintura, eu sentado numa cadeira e ele de pé, com a coronha da arma no coldre há uns três centímetros do meu nariz. Aí, um outro, bancando o "bonzinho", disse mais ou menos o seguinte:
- Vocês não então entendendo... Estão trocando as palavras como revolta, sangue, etc. e não é aí que a coisa tá pegando...
- Eu, claro, perguntei educadamente se ele poderia me esclarecer melhor. E, como se tivesse levado um "telefone" nos tímpanos, ouvi, estarrecido a resposta, em voz mais baixa, gutural, cheia de mistério, como quem dá uma dica perigosa:
- O problema é essa história de negro, negro, negro...

Eu havia sido atropelado, não pelas piadinhas tipo tiziu, pudim de asfalto etc, mas pelo panzer do racismo nazi-ideológico oficial".

 

VEJA TAMBÉM:

João Cândido: vitória sobre a chibata


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