Publicado por José Geraldo Magalhães em Expositor Cristão, Destaques Nacionais, Música e Arte, Mídia - 31/07/2014
As músicas que cantamos na igreja possuem conteúdos questionáveis?
Todos/as conhecemos o famoso ditado: “Quem canta, seus males espanta.” Ainda que não seja uma verdade absoluta, sabemos, com clareza, que a música mexe com as emoções. Na Igreja não é diferente. Um momento de louvor com música bem tocada e com conteúdo pode mexer positivamente com as emoções e edificar. Porém, quando mal conduzida, pode manipular e infundir doutrinas estranhas às Escrituras Sagradas.
Vejamos como isso ocorre na Bíblia, na história da Igreja e nos dias atuais.
O cântico do Povo de Deus no mundo bíblico - Devemos começar apontando o livro de Salmos como revelador da vida cúltica, da adoração a Deus, da música na vida do povo, embora reconheçamos que nem todos eles eram canções, há orações, sabedoria etc. Mas, sem dúvida, seu ambiente maior de expressão foi o culto. Vejamos o que nos ensina o professor Tércio Machado Siqueira sobre os Salmos do Povo de Deus.
“O livro de Salmos” - “O nome ‘Salmos’, curiosamente, não vem da Bíblia hebraica, mas da tradução grega (feita no III Século antes de Cristo). O nome ‘Salmo’ vem do instrumento musical ‘saltério’, usado para acompanhar os lamentos. Nos tempos de Jesus, parece que o livro já possuía esse nome (cf. Lc 20.42; 24.44; At 1.20; 13.33). O título hebraico é ‘Livro dos Hinos’. Curiosamente, esses nomes não retratam o conteúdo das poesias, pois o livro de Salmos possui hino, cântico, oração, lamento, queixa, súplica, ditos de sabedoria etc.”
No caso do Novo Testamento, o texto nos apresenta uma sequência que denuncia o modo de culto das comunidades cristãs primitivas. As mais antigas liturgias seguiam o roteiro da narrativa do Evangelho. Celebrava-se do nascimento à paixão e ressurreição. Sim, a ressurreição era a grande mensagem do culto cristão, não é a toa que o dia de culto, reunião dos/as cristãos/ãs, tornou-se o primeiro da semana, o domingo, que em síntese quer dizer dia do Senhor.
Quando estudamos as formas literárias no Novo Testamento, uma das formas fixas são os hinos. Há, no entanto, uma infinidade deles nas cartas, como o hino ao messias, de Fl 2.5-11. Há outros pequenos como: 1Tm 3.16; Ef 5.14. A maioria das Bíblias já reconhece essas formas.
Concluindo, tanto no Antigo Testamento como no Novo Testamento, os hinos eram expressões da fé reconhecida, aceita e pregada pelo ministério reconhecido; havia uma ortodoxia = reta doutrina nos cânticos do povo de Deus.
O cântico do Povo de Deus na história da Igreja, especialmente do metodismo - A história do povo cristão é marcada definitivamente pela música, como vimos, uma herança bíblica. John Fox, em seu livro clássico sobre os Mártires, menciona que muitos/as cristãos/ãs ao sofrerem suplício por sua fé cantavam hinos de louvor a Deus.
Neste quadro é que entra o metodismo. É sabido que o avivamento metodista se fez acompanhar de uma revolução hinológica, cujo líder foi o irmão de João Wesley, Carlos Wesley. Vejamos o que o Dr. Halford E. Luccock diz de Carlos Wesley e da música no movimento metodista.
“Frequentemente, entre 1730 e 1740, ao fim do dia ou mesmo à noite, um homem, cavalgando um cavalo cansado, parava à frente de um pequeno edifício em City Road, Londres. Isso soa como o começo de salteador de estradas, não é? E é assim mesmo, embora seja um tipo diferente do tradicional salteador de estradas. Esse homem percorreu mais estradas do que os célebres bandidos. Desmonta do cavalo, corre para a porta e grita: ‘Pena e tinta! Pena e tinta!’ como se a sua vida dependesse disso. O edifício era o quartel-general do metodismo, e o homem era Carlos Wesley, voltando de uma jornada de preparação, homem destinado a ser conhecido como, provavelmente, o maior compositor de hinos da história cristã.” Os/as metodistas eram um povo que cantava. Nisso se patenteia muito o poder do movimento.
O povo de Deus e o que se canta hoje - Uma constatação nos nossos dias, é que o mercado evangélico se tornou altamente lucrativo para as empresas de produtos musicais. O importante hoje não é o que Deus espera de nós, mas o que a galera gosta, o que me dá prazer. Isso se manifesta na religiosidade em geral, cada vez mais há pessoas sendo afetadas pela “onda evangélica”, e poucas são realmente transformadas por Jesus. Há também uma necessidade intensa de novidades, fruto da lógica do consumo do mercado, que precisa produzir e vender. Desse modo, a música evangélica, o gospel, virou artigo da moda e do consumo. Novas “ondas” surgem, muitas não resistem a uma análise bíblica fundamental. O problema é que com a capacidade que a música tem de formar hábitos, valores e conceitos, nós estamos correndo sérios riscos de perder o rumo, de tirar o foco de Jesus para valorizarmos os instrumentos, nos dois sentidos.
Há muitos cânticos com belas poesias promovendo ideologias humanas, prosperidade, a tal fé positiva de Kenneth E. Hagin. Eu declaro e Deus faz! Invertendo a ordem, Deus deixa de ser Senhor para ser meu servo.
Por isso, é importante que pastores/as acompanhem os ensaios do ministério de música e os/as ajudem a selecionarem hinos que transmitam a sã doutrina da Palavra. Como no hino 377 do Hinário Evangélico “Medo tens que o tentador te vá vencer...” ou a de Asaph Borba “Nós somos o povo a quem Deus libertou, verdadeiramente somos livres...” Há muita coisa boa para ser cantada, não precisamos estar na “onda”, mas na Bíblia. Por isso, atentos à Palavra, louvemos ao Senhor.
Bispo Paulo Lockmann
Presidente do Concílio Mundial Metodista e da 1ª Região
Bibliografia:
Siqueira, Tércio – Hinos do Povo de Deus. São Paulo, Editora Imprensa Metodista, 1993.
Halford E. Luccock – Linha de Esplendor Sem Fim, Rio de Janeiro, Ed. Bennett, 2001, p35.
Schweizer, Eduard – La Iglesia Primitiva, Meio Ambiente, Organizoción y Culto. Salamanca, Editora Sigueme, 1974.
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