Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

Espírito Santo na herança wesleyana.

Quais são os sinais da ação do Espírito? Como a Igreja Metodista se posiciona acerca do dom de línguas?

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 Em 1906, um pequeno grupo de cristãos reunido na rua Azuza, em Los Angeles (EUA), sob a liderança do pastor William Seymour, deu origem a um movimento religioso que alcançaria o mundo inteiro. O pentecostalismo não se restringiu às igrejas oriundas do avivamento da rua Azuza: características deste movimento se fazem presentes em Igrejas Protestantes históricas e também na Católica Romana via movimento carismático, que, à semelhança do pentecostalismo clássico, apregoa uma experiência do cristão com o Espírito Santo por meio de um pentecostes pessoal, seguido pela manifestação de dons.

Fica patente no Livro O Espírito Santo na Herança Wesleyana, de Mack Stokes, que o Metodismo também enfatiza uma experiência com o Espírito Santo. Para Wesley, a ação da Terceira Pessoa da Trindade é fator principal no processo de salvação. É Ela quem atua na vida do indivíduo, por meio da graça preveniente, operando o novo nascimento, convencendo da justificação e trabalhando na santificação.

 Batismo no Espírito

É doutrina principal do pentecostalismo o batismo no Espírito Santo como uma segunda bênção evidenciada pela manifestação da glossolalia, fenômeno comumente conhecido como o falar em "línguas estranhas".  

É a partir de tal experiência que o individuo, em muitas comunidades pentecostais ou avivadas, passa a ser visto como um cristão completo, podendo assim ter uma atuação maior no seio da comunidade de fé, galgar várias posições e até alcançar o ministério pastoral.Contudo, o crente que não passou por esta experiência é julgado não apto a exercer determinados ministérios, devendo antes buscar o batismo com o Espírito Santo - que se torna evidente pelo falar em línguas estranhas.

Penso que tal doutrina pode produzir dois efeitos na vida dos membros das igrejas que assim ensinam. Primeiro: em algumas pessoas que exercem o dom da glossolalia pode se manifestar um orgulho espiritual que as leva a tratar os demais crentes como "cristãos de segunda categoria", por não terem tido tal experiência. Tais pessoas usariam do dom não como meio de edificação, tendo em vista servir a Deus, mas sim como um meio de autopromoção, de mostrar que são pessoas renovadas, que estão em um nível de espiritualidade superior às demais. Segundo: os indivíduos que não evidenciam o batismo do Espírito por meio da glossolalia podem se sentir inferiores aos que o manifestam.

Este critério da glossolalia como fator inconteste do batismo no Espírito Santo pode fazer com que indivíduos sob pressão, no afã de serem aceitos pelo grupo, passem a exprimir sons que nada têm a ver com as línguas estranhas relatadas em Atos 2 e nas cartas Paulinas, mais precisamente nos capítulos 12 a 14 de 1 Coríntios. Outras pessoas que, não tendo coragem para falsear o dom que os qualificaria como selados pelo Espírito e não o tendo recebido mesmo após intermináveis buscas, podem, a meu ver, abrigar interiormente, sentimentos de rejeição em relação à de Deus.

Tenho atualmente na minha comunidade de fé um rapaz que nasceu e cresceu numa comunidade pentecostal. Há dois anos, ele conheceu uma moça de nossa igreja e começaram a namorar. Tornamo-nos amigos; ele passou a freqüentar minha casa e, algumas vezes, a Igreja Metodista, quando não tinha programação em sua igreja, onde era ministro de louvor.

Certo dia eu estava em meu escritório, quando esse rapaz chegou. Convidei-o a entrar e sentar-se. Notei que ele estava meio abatido e ofereci-lhe um café. Após alguns momentos em silêncio, com as mãos trêmulas ele colocou a xícara no pires e, com olhos cheios de lágrimas e a voz embargada, disse: - Pastor, eu posso fazer uma pergunta? - Respondi-lhe: sim, claro, do que de se trata? Ele respondeu: - Essa história de que só quem fala em línguas é que tem o Espírito Santo é verdade? Eu nasci na igreja, cresci na igreja, eu toco e canto na minha igreja, mas as pessoas lá dizem que eu devo buscar o batismo com o Espírito Santo, porque não falo nem nunca falei em línguas. Eu já venho há tempos orando, jejuando, mas não recebi o dom. Vejo outras pessoas do ministério falando em línguas, eu já pedi tanto, passei noites em vigílias e nada... Eu me sinto rejeitado por Deus, pois no ministério de louvor apenas eu não falo em línguas. Se eu não falo em línguas, é por que não tenho o Espírito Santo, e se eu não tenho o Espírito Santo, não sou filho de Deus... Logo, se não sou filho de Deus não serei salvo. Pois não estou selado para o dia da promessa!

Percebi o quanto o meu amigo estava angustiado. Apesar de ser um cristão realmente comprometido com sua comunidade, membro ativo no ministério de louvor, ele era tido como um cristão incompleto. O anseio de manifestar a glossolalia e, assim, ser aceito sem reservas pelo grupo mexia tanto no brio de Daniel, que a ausência do dom o levou ver-se como um rejeitado por Deus.

Os frutos do Espírito

Inicialmente falei-lhe da graça preveniente, e que na concepção metodista o Espírito Santo atua na vida do indivíduo mesmo antes dele se tornar cristão. Expliquei-lhe que, à luz das Escrituras, ninguém pode se tornar e viver verdadeiramente como cristão, sem a atuação e testemunho do Espírito. Iniciamos a partir desse diálogo um estudo bíblico, após o qual ele entendeu que o falar em línguas não é o único dom do Espírito, e que a evidência não está na glossolalia, mas, sim, nos frutos listados por Paulo no capítulo cinco de Gálatas: "Mas o Espírito de Deus produz o amor, a alegria, a paz, a paciência, a delicadeza, a bondade, a fidelidade, a humildade e o domínio próprio". Saber disso trouxe a este jovem paz e a certeza de que não só era aceito, mas também habitado por Deus, através do Espírito Santo.Segundo Mack B. Stokes, João Wesley acreditava que: "em algumas circunstâncias o Espírito poderia agir levando as pessoas a falar em línguas desconhecidas, curar doenças ou operar milagres, mas nunca enfatizava estes elementos como essenciais a nossa salvação" (pg 52).

Wesley sempre defendeu a experiência com o Espírito para dinamizar a vida cristã, tirando-a de uma mera religiosidade. Contudo, ele não reduzia o viver pleno no Espírito Santo a manifestações deste ou daquele dom, ou a experiências particulares. Embora tenha ele mesmo experimentado o coração "estranhamente aquecido", na memorável noite de 24 de maio de 1738, na Rua Aldersgate - sensação acompanhada pela certeza do perdão de seus pecados - Wesley não parou na experiência em si; antes, soube transformá-la em vida com Deus em favor do próximo.

Assim como Wesley, creio que o testemunho do Espírito é fundamental; porém, penso que o verdadeiro testemunho interior tem que se manifestar no exterior, trazendo transformações individuais e coletivas. Ou seja, minhas obras realizadas em e por amor demonstram que estou cheio e sou movido pelo Espírito Santo. Compreendo os dons como ferramentas dadas por Deus a fim de serem usadas no serviço, na construção de seu Reino. Creio na contemporaneidade dos dons, e não sou contra a busca dos mesmos, mas o que questiono são as razões pelas quais muitos atualmente os buscam. Vejo que aquilo que as Escrituras apontam como ferramentas a serem buscadas tendo em vista poder servir, muitos as têm buscado a fim de se servirem do poder, a fim de edificar não a comunidade, mas a seus egos. Em contraste a isso, Paulo, referindo-se aos dons como instrumento de edificação da Igreja, ensinou à comunidade de Corinto: "Assim também vós, visto que desejais dons espirituais, procurai progredir, para a edificação da igreja" (1 Coríntios 12:12).

Paulo entende que a plenitude do Espírito Santo se faz notar por meio da manifestação daquilo que define como "caminho sobremodo excelente", caminho que o texto bíblico de 1 João 4.8 dá a conhecer como sendo a essência de Deus: o amor. Com este atributo ou essência de Deus - que o Espírito Santo manifesta de forma inconteste na vida do cristão, caracterizando-o como sua habitação e instrumento - Paulo também encabeça a lista dos frutos do Espírito em Gálatas 5.22. Assim sendo, é natural que alguém que se diz cheio do Espírito Santo deva estar cheio de amor. Mas qual a razão de o Espírito Santo encher uma pessoa de amor, a ponto de a manifestação desse sentimento ser o maior indicativo de conhecimento de Deus, e plenitude do Espírito Santo? A isso responde Mack B. Stokes: "Todas as pessoas, portanto, que são cheias do Espírito agem, necessariamente, no sentido de praticar todo o bem possível em favor dos outros" (página 3).

Portanto, a prova inconteste de que alguém está cheio do Espírito Santo é o amor, porque o amor procede de Deus. Toda pessoa que ama é nascida de Deus e conhece a Deus. Afinal, ninguém pode conhecer a Deus, e muito menos amá-lo sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, e ainda amar o inimigo, orar pelos que lhe perseguem e abençoar os que lhe amaldiçoam se não for por obra e graça do Espírito Santo. É possível falsificar a glossolalia, mas é impossível falsificar o amor, pois o amor possui atributos que demonstram características que só se encontram em Deus: O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre tudo crê, tudo espera, tudo suporta.(1 Coríntios 13.4-13)

Pr. José do Carmo da Silva, "José do Egito".

Igreja Metodista em Fátima do Sul - MS.

Veja também: Como a Igreja Metodista se posiciona acerca do dom de línguas.


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