Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013
Entrevista Santana
Veja no final da entrevista a Cartilha: Justiça Transformadora - ser Igreja e superar o racismo: texto integral.
Com lideranças pentecostais do Rio de Janeiro articulando um encontro de 410 lideranças de vários grupos pentecostais do Grande Rio. |
Rev. Sant'Ana, um dos plestrantes no encontro nacional sobre Diversidade Religiosa, Direitos Humanos e Paz.-Fortaleza, Ceará. 2007. |
Foto histórica. Liderança da Comissão Nacional de Combate ao Racismo-Igreja Metodista.Década de 70. |
1) Por que você optou pelo ministério pastoral e como foi o início de sua carreira ministerial e de sua militância contra o racismo, a discriminação, a intolerância e a defesa dos direitos humanos?
Inicialmente gostaria de dizer que se eu tivesse que voltar atrás e refazer a minha vida, muita coisa poderia mudar, exceto uma: SER NOVAMENTE PASTOR. Entre as escolhas que eu fiz na minha vida, ser pastor foi a mais feliz de todas. Hoje beirando os 72 anos, sinto um prazer imenso em ser Pastor e orgulho muito especial em ser um REVERENDO METODISTA, pois foi no exercício deste ministério missionário dentro da sociedade que consegui aprofundar-me nos segredos do amor ao próximo e à sociedade como um todo.
Dona Rita, a pedagoga de Deus
A motivação para desenvolver o ministério pastoral com ênfase na área social surgiu na minha infância. É de berço, porque minha mãe, dona Rita Margarida de Jesus, iniciou-me nos primeiros passos. Fui abençoado por tê-la acompanhado em suas visitas aos enfermos, às famílias dos bairros pobres onde atuava como parteira popular, além de amamentar as crianças cujas mães não tinham condições de fazê-lo. Por que a Dona Rita selecionou-me entre os sete filhos e filhas (três mulheres e quatro homens) para acompanhá-la? Quantas vezes insisti para não ir e ela me obrigava a acompanhá-la. Hoje eu sei. Eu não tenho dúvidas que Deus usou a minha mãe como um instrumento poderoso, como uma pedagoga de Deus ensinando-me os segredos de como caminhar com amor cristalizado num relacionamento humano profundamente solidário. Analfabeta, exercia sabiamente as suas habilidades na prática do amor ao próximo. A ela, eu devo a abençoada vocação para o exercício de meu ministério pastoral na área social e por extensão aos vitimizados por qualquer motivo.
Rev. Firmino Lopes dos Santos, o instrumento de Deus
A minha opção pelo ministério pastoral teve o seu primeiro passo formal dado aos doze anos, quando o Rev. Firmino Lopes dos Santos perguntou-me se eu queria ser pastor. Lembro-me bem desta pergunta feita após um culto onde se apresentou o pequeno coral no qual participava como tenor. E a partir daí, iniciamos um diálogo a respeito, resultando na minha recomendação para o Concílio Distrital e a seguir, para o Concílio Regional. Estava com 13 anos. E neste ponto vale a pena contar a inusitada experiência que vivi por ocasião do Concilio Regional da Quarta Região, em janeiro de 1950, na cidade de Belo Horizonte. Saímos de João Monlevade, MG, eu e o Rev. Firmino, para participar do Concílio Regional no Izabela, mas, como não era membro do Concílio, eu tinha que hospedar-me em um hotel. E nesta tentativa senti, pela primeira vez, de maneira bem visível, a virulência do racismo. Em um táxi rodamos vários hotéis de Belo Horizonte tentando a minha hospedagem e em nenhum "havia vaga". E os recepcionistas se entreolhavam e sorriam em sinal de deboche. Com os meus 13 anos incompletos não tinha a dimensão da gravidade desta atitude racista, mas a marca ficou em mim, indelével.
A maravilhosa experiência em Juiz de Fora - no Granbery e nas igrejas de S.Mateus e Jardinópolis (Cachoeirinha).
Os sete anos que passei no Granbery, em Juiz de Fora, foram excepcionais no fortalecimento da minha opção para o ministério pastoral. Foi interessante e de profundo significado na minha vida sair da caixa de engraxate na praça central de João Monlevade, MG, do tabuleiro de pé-de-moleque que vendia nas ruas, praças e oficinas da Siderúrgica Belgo-Mineira, dos pesados sacos de laranja-baía, para estudar numa das escolas mais famosas do país naquela época. E não poucos, incluindo membros da minha igreja local, achavam que eu, por ser um adolescente hiperativo, não me adaptaria ao conhecido rigor disciplinar do Granbery.
Encantado com a nova vida, adaptei-me sem maiores problemas, porque os conselhos dados todas as manhãs no culto doméstico encontraram eco dentro de mim, preparando-me para a jornada a mim reservada. O culto doméstico tem, portanto, um caráter espiritual, formativo e profundamente simbólico na minha vida. Era o momento dos hinos e corinhos, das leituras bíblicas indicadas pela revista da Escola Dominical, dos conselhos sobre o bom comportamento na rua, na escola, ou em todas as atividades fora do ambiente familiar. E o ambiente familiar e aconchegante de minha casa foi complementado pelas igrejas metodistas dos bairros de São Mateus e de Cachoeirinha (hoje Jardinópolis), cujos membros carinhosos nos acolhiam como filhos e os jovens, como irmãos.
Em 1956 recebi um valioso prêmio: cuidar de um ponto de pregação numa favela onde morava uma família metodista desejosa em ter em sua casa um ponto missionário. Por dois anos, todo domingo à tarde, 15hs, reuníamos as crianças e alguns jovens para contar histórias, cantar e orar. E antes de viajar para as férias de final de ano, fazíamos uma festa onde distribuíamos algumas roupas de cama, vestimentas e calçados, doados pelos alunos do internato do Granbery que não voltariam no ano seguinte. Era a semente da solidariedade humana ganhando força no coração juvenil.
O racismo praticado no Brasil leva em consideração a COR DA PELE
Creio ser interessante dizer que preto é cor. Eu sou preto. Mas sou também negro. Ser negro é ter consciência de sua negritude. Portanto eu sou preto, sou negro e sou lindo.
Outro detalhe importante: pretos e pardos geralmente são as vítimas preferenciais dos racistas. O preto mais que o pardo. O sociólogo Florestan Fernandes declara em sua vastíssima obra sobre racismo que a cor da pele está relacionada à maior ou menor aceitação do discriminado. Quanto mais clara a cor da pele mais sceitação ele tem da parte do branco. Em assim sendo, os pardos sofrem uma discriminação menos dolorosa.
O nosso drama por ser preto começa muito cedo. A criança preta ou já na sua infância e adolescência vai aos poucos notando que ela é tratada diferentemente em relação às outras crianças brancas. Vai observando que boa parte das referências às coisas feias, negativas, desprezíveis é representada pela cor preta. E quando ela tem as primeiras aulas de geografia, descobre que existe uma África pobre, paupérrima. E aí ela olha para a sua cor, para a cor das crianças pretas africanas, boa parte delas esquálidas, sofridas, famintas, mamando em um peito seco. Essa dolorosa imagem fica gravada na sua memória, como ficou na minha. Aí chega a adolescência e ela é forçada a fazer uma escolha: ficar quieta e fazer de tudo para branquear-se de um jeito ou de outro, ou então partir para a luta. Quanto a mim, foi o que eu fiz. Sem esquecer-me do que ficou para trás, prossigo para o alvo: lutar e superar o racismo, a discriminação de todos os tipos, a indesejável intolerância, a xenofobia e a violência e suas maléficas conseqüências.
É desagradável afirmar, mas há uma diferença muito grande em ser discriminado pela família religiosa da qual faz parte e ser discriminado na sociedade como um todo. Nesta você tem as leis que o protege, mesmo fraca como a do Senador Afonso Arinos ou até a atual onde o racismo é tratado como crime. E dentro da igreja, como é que fica? Pois foi exatamente dentro da igreja que eu senti como o racismo era e ainda é forte. Brincadeiras de mau gosto que nos ofendiam, reclamações repletas de lágrimas de colegas que se sentiam discriminados nas nomeações, frases altamente ofensivas de membros racistas. No meu caso, em algumas igrejas por onde passei, no primeiro domingo à noite o templo enchia. Todos queriam ver o novo pastor pretinho e baixinho falar. E durante a semana eu ficava sabendo que eu apesar de preto, falava bem.
E esse racismo não era privilégio das igrejas evangélicas brasileiras. O mesmo acontecia nos encontros internacionais. No Panamá, num encontro latino-americano, no momento da apresentação, alguns participantes se apresentavam declarando ser de "ascendência" norte-americana, outros inglesa, outros francesa. Ao chegar a minha vez, engrossei a voz, estufei o peito e disse: "ascendência africana, Angola e Bantu". O recado era claro. O branco não é superior ao preto. É diferente. Essa pretensa superioridade do branco criou a abominável ideologia do branqueamento.
Nós sabemos que o racismo está impregnado na espinha dorsal do comportamento social, isto é, discrimina-se naturalmente, sem ter plena consciência que está magoando profundamente o outro, a outra, vítima. E a vítima geralmente é invisível. Daí entender, apesar de não aceitar, as práticas racistas embutidas na linguagem cultural e religiosa. Não é tão simples erradicá-las.
2) Quando se formou em Teologia?
Terminei o meu bacharelado em teologia em 1963. E para tal prepararei uma dissertação de final de curso intitulada: Bases Bíblicas e Teológicas da Responsabilidade Social da Igreja. E agraciado pelos meus colegas de formatura fui indicado como o orador da turma e lembro-me bem que no dia 8 de dezembro de 1963, no Salão Nobre da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista em Rudge Ramos, S. Bernardo do Campo, iniciei o meu discurso declarando que "nós estamos prestes a iniciar formalmente o nosso ministério pastoral em uma sociedade caracterizada pelo abismo entre as gerações, entre brancos e negros, entre ricos e pobres, entre analfabetos e letrados, entre casebres e palácios..." Saí da Faculdade de Teologia com um propósito e não mudei uma vírgula sequer nestes 46 anos de luta. Ao contrário, avancei substancialmente com as novas experiências e conhecimentos adquiridos no Brasil e no exterior, dedicando-me à defesa do injustiçado, não importando a sua religião, etnia ou condição social. Dediquei-me e ainda continuo me dedicando de corpo e alma àqueles que Cristo denominou seus seguidores de "outros apriscos". Invisíveis, sem nome, desprotegidos e esquecidos dos conglomerados e magnatas da fé que pouco têm a ver com a "IGREJA, POVO DE DEUS".
3. O que o despertou para a temática dos direitos humanos?
A temática sobre Direitos Humanos entrou em minha vida e atividades por muitas portas e uma delas foi a proposta desenvolvida no nascedouro do meu pastorado no bairro Engenho Velho da Federação, Salvador, Bahia. Vi-me repentinamente numa igreja pobre, num bairro pobre, sem infra-estrutura sanitária, sem escola para uma imensa população infantil e adolescente de maioria negra. Ao notar aquela realidade dolorosa, senti-me responsável e compelido a fazer algo como pastor da igreja local. Eu estava no lugar certo e na hora certa. Substituí um missionário norte-americano que tinha recursos financeiros que lhe permitia manter a criançada na escola dominical, dando-lhes balas ao final desta. E no meu primeiro domingo, recebido com muito carinho, terminada a escola dominical, veio o superintendente da escola e disse que a criançada estava esperando a distribuição de balas. E eu não tinha balas para distribuir. E aos poucos o número de crianças começou a decrescer. Eram aproximadamente 50 crianças. Lindas, brincalhonas e sorridentes. O que fazer? Balas e doces atraem as crianças, mas o que elas realmente precisavam mesmo era de escola. Era o seu direito humano imediato. Depois de conversar com os membros da igreja a respeito desta necessidade básica e de envolver outros membros da comunidade, fomos até a Secretaria Municipal de Educação e estabelecemos um diálogo franco e aberto a respeito. Como conseqüência, conseguimos a professora - o que já era um bom começo. Usamos as dependências da igreja por uns tempos e concluímos que não havia outra saída a não ser fazer o que a maioria dos moradores tinha feito, invadir uma área pública e ali construir as duas salas que necessitávamos. E assim foi feito. Ano, 1964. O conteúdo da dissertação de final do curso começava a ser colocado em prática.
Direitos Humano versus Ditadura, tortura, assassinatos e o silêncio das igrejas.
O despertar para os direitos humanos passa sempre pela dor e sofrimento do povo. Passa pela prática da injustiça geradora de tanta miséria e corrupção. E não nos esqueçamos que, entre aqueles que introduziram a discussão sobre Direitos Humanos no Brasil, estão algumas Igrejas que, por meio de seus vários grupos liderados por teólogos, sociólogos, antropólogos, educadores, pastores(as) e líderes populares, todos impulsionados pela fé, introduziram no interior das igrejas locais a discussão sobre a vinculação profunda que havia entre os direitos humanos e a pessoa humana. Muitos "irmãos e irmãs" ignoraram, mas muitos de nós nos tornamos frutos daqueles momentos de esperança, amor e potente fé que superavam os medos e covardias diante da ditadura opressora. Havia uma igreja atuante, presente na liderança e na base de nossas igrejas, e outra igreja silenciosa, negando-se ao sagrado exercício da profecia e testemunho em momentos de perseguição, sofrimentos e sacrifício.
A força e testemunho da igreja atuante
Quem não se lembra das lições da escola dominical que discutiam abertamente se o "cristão deveria ser de direita ou esquerda, das lições que nos desafiavam a agir como cidadãos e cidadãs responsáveis, homens e mulheres de boa vontade, praticantes de uma fé encarnada na realidade, das memoráveis celebrações ecumênicas da Praça da Sé organizadas por grupos sociais bem diversificados, onde participei não poucas vezes como o orador evangélico, Henry Sobel representando a comunidade judaica e o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns representando a comunidade católica. Falávamos para milhares e milhares de pessoas que se acotovelavam naquele "espaço de liberdade". Chegávamos e saíamos os três no carro do Cardeal por razões de segurança. Era perigoso? Era. Mas foi um momento grandioso viver a pujança da nossa fé e testemunhar que Jesus Cristo é O Senhor, Aquele que derruba os muros da desigualdade e fortalece a prática da justiça.
As grandes celebrações ecumênicas realizadas no final da década de 60, 70 e 80 em Belo Horizonte, marcaram muito a minha vida e meu ministério pastoral. Formar parceria no púlpito com Dom Hélder Câmara e os padres carmelitas na Igreja Católica Romana do Carmo, Belo Horizonte, por vários anos seguidos foi uma fantástica experiência para a minha postura de fé e de missionário junto ao povo sofrido. Aprendi com Dom Hélder, grande servo do Senhor, que quando assumimos a postura profética, estamos seguindo os passos dos grandes baluartes da fé, participantes de uma "linha de esplendor sem fim" que não se matrimoniaram com o poder opressor constituído.
Direitos Humanos são Direitos Divinos: a feliz parceria com os pentecostais
Todo operador de direitos humanos, militante contra o racismo, contra a violência, sabe que é necessário atuar a partir de parcerias bem diversificadas e um forte envolvimento na luta. E todo pastor ou pastora que se envolve nas lutas comunitárias necessita de uma personalidade firme e uma identidade religiosa definida. Com estas características torna-se mais fácil o diálogo e a aproximação com diferentes grupos.
O que me levou ao diálogo com os pentecostais e outros grupos religiosos não pertencentes ao diálogo ecumênico tradicional, histórico, foi a minha aproximação com a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR), Brasília, em meados dos anos 90. Desafios me empurravam para áreas inexploradas e algumas perguntas angustiantes sobre a ineficácia e morosidade das relações ecumênicas precisavam de respostas e estas só podiam ser conseguidas com um diálogo corajoso e respeitoso.
Parceria com setores governamentais- local, estadual e federal.
O projeto "As Igrejas e os Direitos Humanos" nos aproximou de setores governamentais, bem como dos grupos religiosos não cristãos e das igrejas pentecostais e históricas não pertencentes ao diálogo ecumênico. A vinculação com o combate e superação do racismo e a defesa dos Direitos Humanos, abriu uma imensa porta de diálogo e oportunidades de divulgação das igrejas evangélicas, com destaque para a Igreja Metodista. Foi uma estratégia bem sucedida. Passei a relacionar-me com as igrejas e demais grupos religiosos como um consultor voluntário da SEDH/PR. Em 2003, a Cenacora e a SEDH/PR convocaram a Brasília 78 lideranças cristãs, que se reuniram por três dias participando do seminário AS IGREJAS E OS DIRETOS HUMANOS - Capacitação de lideranças Religiosas (pastores,pastoras, diáconos, diaconisas, padres e freiras).
Quando o governo brasileiro decidiu implantar no Brasil a Convenção 111 da OIT- Organização Internacional do Trabalho, formou-se uma comissão de alto nível para implantar a Convenção. Fui convidado a ser o representante negro nesta comissão para falar sobre Discriminação no Trabalho aos empresários nas cerimônias que aconteceram nas Delegacias Regionais do Trabalho de cada Estado.
Por ocasião da Conferência Mundial da ONU sobre Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, em 2002, em Durban, África do Sul, o governo brasileiro organizou uma comissão especial formada por 30 membros do governo e da sociedade civil para preparar o documento do país bem como representar o Brasil em Durban. Tive a honra de ser um deles. O curioso é que o Conselho Mundial de Igrejas indicou-me também para representá-lo em Durban. Representei oficialmente o meu país e o CMI.
Mas eu considero o bom relacionamento com a comunidade pentecostal o nosso melhor e mais significativo avanço. Rev. Breno Schumann, meu colega pastor em Juiz de Fora, já falecido, por ocasião de uma de nossas viagens pastorais, ele para Lima Duarte e eu para Matias Barbosa(MG), me disse que os pentecostais seriam o maior e um dos mais importantes grupos entre os evangélicos do Brasil no futuro. Ele estava certo. Interessante observar que simplesmente ignoraram a postura ecumênica adotada nas atividades.
3) Quando e como iniciou o trabalho na Cenacora?
Antes de falar sobre a Cenacora - Comissão Ecumênica Nacional de Combate ao Racismo torna-se necessário falar sobre a Comissão Nacional de Combate ao Racismo, criada por um grupo de negros metodistas centrados em Minas Gerais, Rio de Janeiro, S.Paulo e Rio Grande do Sul. Ano: 1973, por ocasião do Encontro Mundial do Metodismo acontecido no Rio de Janeiro. Informalmente criada, passamos 12 anos tentando oficializá-la com o apoio do Colégio Episcopal, nada conseguindo, apesar da simpatia de alguns Bispos. Temia-se o surgimento de discussões geradoras de desentendimentos, considerando o principal argumento de muitos de que "na igreja não existe racismo, somos todos irmãos".
Década de 60-Serra da Barriga,União de Palmares-Alagoas- Dia da Consciência Negra-Presente o Dom José Maria Pires,hoje conhecido como Dom Zumbi.Naquela época Dom Pelé. |
Em setembro de 1985, exercendo o cargo de Secretário Geral de Ação Social da Igreja Metodista no Brasil, devidamente autorizado pelo Conselho Geral da Igreja Metodista, e com o apoio financeiro da Junta de Mulheres Metodistas dos Estados Unidos e do Programa de Combate ao Racismo do Conselho Mundial de Igrejas, Genebra, contando ainda com a inestimável simpatia de Clai e Ciemal, convocamos o "Primeiro Encontro Nacional do Negro Metodista" no Rio de Janeiro, no Instituto Metodista Bennett. Sessenta e dois negros, sendo 42 metodistas vindos de todas as regiões eclesiásticas e 20 negros ativistas experientes convidados para compartilhar o seu saber específico para os negros metodistas. Solidarizaram-se com o nosso inédito encontro repassando a sua experiência, entre outros, Benedita da Silva, então Deputada Estadual, cineasta Joelzito (Zezito) Araújo, economista Hélio Santos, advogado Antonio Carlos Arruda, a renomada educadora negra Lélia Gonzalez, Herbert de Souza, o Betinho, que orientou-nos quanto à necessidade de se fazer uma análise de conjuntura, necessária para o estabelecimento adequado de estratégias e metodologia de trabalho na luta contra a o poder opressor, gerador de injustiça e de morte.
Ao final dos três dias do encontro é formalizada a criação da Comissão Nacional de Combate ao Racismo, na Igreja Metodista do Brasil. A decisão do negro metodista é comunicada às lideranças eclesiásticas e inicia-se a sua atuação inédita, combatendo o racismo que estava impregnado em nossa hinologia, literatura religiosa, lições da escola dominical e nos sermões. A pesquisa e análise da existência do racismo na vida e obra da Igreja Metodista alcançaram resultados positivos e logo se tornaram conhecidos da militância de outras Igrejas Nacionais, gerando ao longo destes anos o surgimento de comissões, grupos e militâncias individuais contra o racismo.
CRIAÇÃO DA CENACORA
Como Secretário Geral de Ação Social da Igreja Metodista, após articulações feitas no início de 1986, foram convidados representantes das Igrejas Nacionais, membros do CONIC- Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil, objetivando a criação de uma comissão ecumênica semelhante à da Igreja Metodista. Reunidos na Chácara Flora, S.Paulo, os representantes das Igrejas membros do CONIC concordam na criação de um organismo semelhante que pudesse "representar" as Igrejas fundadoras: Episcopal do Brasil, Evangélica de Confissão Luterana do Brasil, Metodista do Brasil, Presbiteriana Unida do Brasil e Católica Apostólica Romana. Mais tarde retira-se a Igreja Presbiteriana Unida do Brasil, agregando-se, contudo, outras duas, Igreja Católica Ortodoxa Siriana do Brasil e Igreja Evangélica Luterana do Brasil. E por decisão da Assembléia da Cenacora, foram recebidas como membros as organizações evangélicas dedicadas ao combate ao racismo: Missões Quilombo e Instituto Nacional de Debates Nelson Mandela, ambas de S.Paulo; Igreja Pentecostal "O Brasil para Cristo" e um grupo do Rio de Janeiro, de maioria Batista, Markingjr , Movimento de Ação e Reflexão Martin Luther King Jr.
Em oito de fevereiro de 1988, reconhecendo a prestação de serviço na área de combate ao racismo, à discriminação, à intolerância, aos preconceitos, à xenofobia, a Assembléia do Conic realizada em Porto Alegre recebe a Cenacora como um de seus departamentos. A parceria, contudo, durou pouco tempo. Eram dois organismos ecumênicos que tinham metodologias e estratégias completamente diferentes. O CONIC burocratizado, seguindo normas estatutárias adequadas à sua realidade funcional. E a Cenacora, uma organização com características populares que atuava através de respostas imediatas às demandas de sua área, não adequou-se ao sistema burocratizado do CONIC, separando-se, para agir com mais liberdade e presteza, continuando, contudo como um organismo membro.
4) Que projetos você conseguiu desenvolver na Cenacora que o marcaram mais ou lhe deram mais satisfação?
Os projetos desenvolvidos pela Cenacora centralizam-se tanto nas igrejas e suas instituições como na sociedade brasileira, preferencialmente no entorno das igrejas. Quando iniciamos estávamos ansiosos para avaliar seriamente os racismos embutidos na literatura religiosa, nos sermões, nas lições de escola dominical e nos hinos que cantávamos com tanto ardor. Fomos às diferentes livrarias evangélicas e adquirimos o seu material religioso, assistimos aos cultos das igrejas membros da Cenacora, bem como de pentecostais, batistas e presbiterianos. E observávamos também o relacionamento pessoal entre os membros, onde os vários grupos assentavam-se, como se cumprimentavam. Este esforço era necessário para sermos justos na análise. Encontramos evidentes práticas do racismo bem como um relacionamento amável entre os membros de diferentes etnias. Daí concluirmos que o caminho mais seguro era analisar o que se dizia e o que se escrevia, isto é, os sermões, as palestras e o material religioso contidos em revista de escola dominical, sermões, livros religiosos, etc. E a partir daí, organizar a nossa campanha, os seminários, palestras e a produção de materiais.
Havia, contudo, um prazer imenso nas atividades que desenvolvíamos tendo como tema central a mulher e a criança. E em especial a mulher e a criança negras. Para você entender uma pessoa vitimizada por definição, isto é, que já nasceu com o estigma do sofrimento por causa da cor de sua pele, você tem que enternecer-se por ela e estar junto a ela o tempo todo. Nunca ser uma espécie de médico legista que lida com um corpo inerte. Em nossos encontros ou através de entrevistas pessoais, vislumbramos e compartilhamos muita dor e sofrimento. Mulheres negras, brancas, pardas e indígenas tratadas como se fossem lixo, pior, depósito de espermas daqueles homens irresponsáveis que imaginam serem donos do corpo e sonhos das mulheres.
Você tem uma idéia do que se passa na cabeça de uma mulher negra adolescente ou jovem que sonha, luta por este sonho fazendo o seu curso noturno e varando as madrugadas estudando, depois de um dia cansativo? Ela termina o seu curso e na hora de procurar um emprego, descobre que a cor de sua pele lhe impede de realizar o seu sonho. Pode até conseguir emprego, mas certamente ganhará menos que a mulher branca, o homem branco e até do homem negro. Eu escutei muitas vezes: "Pastor,estudar prá quê?". Estudar para ter melhores condições de lutar para mudar este caos, gerador de sofrimento e injustiça.
5) O que você gostaria que as novas lideranças da Cenacora desenvolvessem? Que projetos para o futuro, metas, etc ?
Você sabe que não sou mais o executivo da Cenacora. Quando deixei a Cenacora em setembro de 2008, já tínhamos implantado dois interessantes programas: um envolvendo uma campanha nacional junto às Igrejas Nacionais para que estas colocassem as suas congregações existentes nos mais diferentes recantos deste país a serviço da localização de crianças sem o RCN (registro civil de nascimento). Por que uma campanha nacional para o RCN de crianças? Porque há quase um milhão delas sem o RCN no Brasil. E a SEDH/PR- Secretária Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República sondou a Secretaria Executiva da Cenacora em fins de 2006 sobre a possibilidade de se preparar um projeto sobre o RCN envolvendo as Igrejas Evangélicas, tendo como base dois programas com o mesmo objetivo.
Primeiro programa: A primeira opção do primeiro programa segue basicamente a programação da SEDH/PR, portanto, governamental e voltada para o nordeste e norte, as áreas onde o índice de crianças sem documentos é o maior do país. No programa elaborado coube à Cenacora trabalhar o projeto junto às autoridades eclesiásticas, em suas respectivas sedes nacionais, regionais e locais. Foi um trabalho intenso e demorado, considerando que o programa seria, como está sendo,implementado em todo o país.
Mas, além de desenvolver o projeto junto às autoridades eclesiásticas, era necessário desenvolver o dificílimo trabalho de campo e para isso a Cenacora convidou a Visão Mundial (VM), possuidora de uma grande equipe de técnicos no norte e nordeste. A comissão criada pela VM elaborou uma cartilha excelente, com a ajuda do Cebi - Centro de Estudos Bíblicos, intitulada REGISTRO CIVIL DE CRIANÇAS E ADULTOS - CONVITE ÀS IGREJAS CRISTÃS. Esta cartilha é a ferramenta de trabalho para desafiar as igrejas a serem solidária com as crianças e adultos sem documentos.
Este projeto foi e está sendo desenvolvido no norte e nordeste em parceria com a Visão Mundial. Em recente reunião nacional com os prefeitos de todo o País, o Presidente Lula fez um apelo especial a estes para que dessem especial atenção às providências para localizar e realizar o RCN de crianças e suas famílias através do País.
A segunda opção foi planejada para ser desenvolvida a médio e longo prazo com as diferentes igrejas e suas instituições teológicas, espalhadas por todo o País, objetivando incentivá-las (as Igrejas) a colocar em seu programa anual de atividades esta campanha.
No princípio imaginávamos que localizar crianças sem o RCN seria uma tarefa simples e depois de dar os primeiros passos verificamos que na realidade é uma tarefa complexa, demorada, exigindo encontros para desafiar as igrejas para que cedam voluntários a serem capacitados adequadamente, contatos com o Juizado da Criança e da Adolescência, Defensoria Pública e Ministério Público. Lembrando que é necessário visitar os cartórios de Registro Civil em cada cidade alvo da campanha. Este é, contudo, um desafio digno de ser enfrentado.
Recente decreto governamental solicita às Prefeituras Municipais a criação de uma comissão especial sobre RCN, sendo este o espaço privilegiado a ser ocupado por representantes das organizações comunitárias,incluindo as igrejas solidárias com os dramas vividos por aqueles que não têm ainda cidadania. Quem não tem documento, NÃO EXISTE.
Segundo Programa: A Cenacora desafiou as instituições teológicas brasileiras a analisar um documento JUSTIÇA TRANSFORMADORA: SER IGREJA E SUPERAR O RACISMO (JT) elaborado pelo CMI entre 2000 e 2002 a partir de um pedido feito pelas Igrejas membros em fins da década de 90. A responsabilidade para a elaboração deste documento coube ao Programa do Conselho Mundial de Igrejas Justiça, Paz e Integridade da Criação(JPIC) que convidou um grupo de consultores internacionais, e durante três anos seguidos sempre nas duas primeiras semanas de outubro de cada ano, nós nos reunimos em Genebra para a elaboração deste documento. O documento partiu de experiências que já estavam em processo em alguns países europeus e África do Sul, todas as experiências centradas na Verdade e Reconciliação (África do Sul com Desmond Tutu, na Inglaterra com programas de inclusão patrocinados pela Igreja Metodista, na Noruega com o reconhecimento de cidadania para os "roma" -- no Brasil conhecidos como ciganos). Hoje os roma são líderes eclesiásticos, acadêmicos, políticos,etc. Estas e outras experiências coletadas através do mundo fizeram parte e foram a base para a criação da cartilha JT que se tornou um dos fortes pontos de referência para as Igrejas sobre COMBATE E SUPERAÇÃO DO RACISMO, DA DISCRIMINAÇÃO, DOS PRECONCEITOS, DA XENOFOBIA, DA INTOLERÂNCIA CORRELATA E DA VIOLÊNCIA QUE BANALIZA A VIDA.
A Cenacora, apoiada pelo CMI, desafiou as instituições teológicas das Igrejas membros desta a refletirem crítica e solidariamente sobre o conteúdo da cartilha JT, respondendo à seguinte pergunta: "Como o processo e conceito de justiça transformadora identificam-se com a nossa realidade de racismo dentro das igrejas e sociedade no Brasil levando em consideração a própria história do negro neste país?" Foi sugerido às instituições teológicas adaptarem o conteúdo à própria situação histórica da mulher, sua luta e seus avanços nas sofridas e inquestionáveis conquistas de direitos. Como material complementar, outras duas cartilhas voltadas para duas importantes atividades desenvolvidas pela Cenacora: Diversidade Religiosa e Direitos Humanos e Registro Civil de Crianças e Adultos - Convite às Igrejas, foram entregues às instituições teológicas participantes dos Seminários realizados Em Porto Alegre,Maringá, S.Paulo, Rio de janeiro,,Belo Horizonte, Governador Valadares(MG), Piracicaba(SP),Juiz de Fora(MG).
Alguns destes encontros, como o da PUC-Porto Alegre/RS que reuniu vários Seminários Teológicos, com uma presença significativa de duzentos e oito estudantes e professores para dialogar sobre COMO ENFRENTAR OS MALES SOCIAIS QUE ESTÃO CRESCENDO NÃO SÓ NA SOCIEDADE BRASILEIRA, mas também DENTRO DAS PRÓPRIAS IGREJAS mostrando que estas não estão livres destes males que estão se solidificando nas relações inter-pessoais e inter-fé.
6) Qual a importância da Cenacora para as igrejas e a sociedade? Que vínculos concretos existem entre a instituição e as igrejas locais?
A Cenacora foi uma resposta das Igrejas nacionais de perfil ecumênico à demanda por uma participação maior das igrejas locais nas lutas desenvolvidas contra os males sociais, incluindo neles o racismo,a intolerância, a discriminação,os preconceitos, a xenofobia, a violência. A Cenacora foi mais um espaço criado para ampliar a sua preocupação e cuidado com o bem-estar e humanização do homem e da mulher. Combater o racismo, a discriminação, a intolerância não é uma tarefa simples porque eles são desvios do comportamento humano e estão embutidos na espinha dorsal do comportamento social e religioso. E é responsabilidade da Igreja combatê-los dentro e fora da comunidade religiosa. E a Cenacora foi criada para isso.
E a dificuldade maior que enfrentamos nesta dificílima tarefa está no combate e superação da prática do racismo e a negação da existência do mesmo dentro das igrejas, apesar de sua visibilidade por demais evidente nas relações interpessoais e religiosas.
Por outro lado temos que considerar que combater e superar o racismo, a discriminação e a intolerância são tarefas sempre inacabadas. Estes estão sempre adquirindo novas formas, acompanhando as transformações que ocorrem na sociedade. Exigindo novos métodos e novas estratégias. E temos que ser rápidos nesta tarefa. E exatamente neste ponto está uma de nossas maiores dificuldades: geralmente as igrejas não aderem facilmente às mudanças. Esta mudança nasce da consciência da relação da comunidade religiosa com a realidade do seu entorno. E como aprendemos a falar mais para dentro do templo do que para fora, torna-se difícil envolver fortemente as igrejas nas lutas populares. Há, evidentemente, exceções. E são exatamente estas exceções que fazem a diferença geradora de esperança.
7) Como você avalia a preocupação da Igreja Metodista com a questão da diversidade étnica, questão de gênero, direitos humanos?
É só ler o PLANO PARA VIDA E MISSÃO e uma série de documentos específicos para cada área para concluir que a Igreja Metodista tenta levar a sério, na sua produção de materiais, a sua responsabilidade missionária. Mas, a minha experiência como alguém que vive "fazendo o meio de campo", viajando por todo o país , assuntando a uns e a outros colegas pastores e pastoras e membros, nota-se que os nossos documentos, principalmente o PVM é pouco lido e seguido. O PVM é um livro-guia porque sugere ao pastor uma estratégia a seguir. Enquanto pastor de igreja local, ele tornou-se o meu texto predileto. Isso porque ele se encaixava na minha proposta de trabalho como pastor interessado na vida social e espiritual da comunidade de fé que servia e ao seu entorno,entendido aqui como a cidade e tudo,tudo que nela está. Passei maus momentos com alguns superintendentes distritais que sempre me exortavam declarando que "eu tinha sido nomeado para a igreja local e somente dela deveria cuidar. Nada de interferir nos problemas da cidade". E devido à minha compreensão e convicção que tinha de que eu era o ministro da palavra de toda a cidade, incluindo seus povo e as suas lideranças,.eu vivia dando explicações a algumas autoridades eclesiásticas. Era o meu dever e responsabilidade envolver-me com todos. Porque todos, sem exceção eram alvos do amor de Deus e a mensagem que repassava trazia a semente da paixão e compaixão. Eram igualmente alvos do amor de Cristo que redime. O povo e os graves problemas, o seu sofrimento ou alegria são o celeiro, a fonte privilegiada, inesgotável e a razão de ser dos nossos sermões.
Para levar a sério a responsabilidade missionária, a igreja e seu ministério pastoral precisam ter a coragem de confrontar a sua fé com outra fé. Digam-me, o que vale uma fé que tem medo de ser confrontada com outra fé? Ela não vale de nada. Por isso, com apoio ou sem apoio, assento-me com qualquer pessoa, independente de sua fé, para dialogar com ela se está disposta a lutar a favor dos direitos humanos, e reconhecer que há uma diversidade religiosa que tem que ser respeitada e que nenhum ser humano é superior a outro. Uma igreja capenga, medrosa, é uma igreja de fracos. Ora, se eu sei em quem tenho crido e sei que Ele é poderoso, por que ter medo?
Um último detalhe: em algumas cidades por onde passei, foi feita uma experiência interessante alavancou substancialmente o meu ministério pastoral: ao chegar a uma cidade, antes que se completassem 30 dias, eu visitava todas as autoridades na seguinte ordem, se possível:(1) Juiz de Direito(porque mandar prender e manda soltar),portanto nada melhor que mostrar-se para o Juiz numa época de ditadura.(2):Prefeito;(3): Vereadores e Presidência;(4):Sectretários Municipais;(5):Delegado e a cadeia(com uma visita especial para os presos- essa visita era de surpresa.(Juiz de Paz- o casamenteiro;(6):Lideranças sindicais;(7): Lideranças comunitárias. Em vista dessa preocupação em algumas cidades acabei sendo indicado Presidente de Comissões de Festejos de aniversário da cidade,mediando reuniões de autoridades municipais com lideranças populares, organizando a distribuição de alimentos e presentes para as comunidades pobres, convidado para falar nas reuniões organizadas pela comunidade por outras igrejas,incluindo a Católica,por clubes tipo Rotary e Lions. Resumo:onde eu ia ,lá estava a minha amada Igreja Metodista.
Veja também: A Cartilha: Justiça Transformadora - ser Igreja e superar o racismo: texto integral.