Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

Doutrinas Cremos no Espírito Santo

 O Deus da Vida presente entre nós: na igreja, no mundo e em toda a criação!

 

"O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres..." (Lc 4.18).

"O Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho, é da mesma substância, majestade e glória com o Pai e com Filho, verdadeiro e eterno Deus" [Artigos de Religião nº 4: Do Espírito Santo].

 

Quando Jesus começou o seu ministério na Galiléia, na sinagoga de Nazaré, foi-lhe dado o livro do profeta Isaías (61.1), do qual leu a passagem cuja frase inicial se encontra citada acima na forma de epígrafe. De acordo com o evangelista, todos o miravam com atenção no momento em que solenemente declarou: "hoje se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir". Ficará mais fácil compreender a reação do povo se dirigirmos nosso olhar para o passado.

Afinal, a ação do Espírito de Deus não era propriamente uma novidade; antes, era muito bem conhecida na antiga aliança. Os fiéis letrados poderiam com facilidade encontrar, no livro das origens, a afirmação de que, no ato da criação, "o Espírito de Deus pairava por sobre as águas" (Gn 1.2). Certamente por essa razão, desde o princípio, o Espírito esteve associado à vida e ao poder criador de Deus que renova todas as coisas (cf. Jó 34.14-15; Sl 104.29-30). A propósito, o termo hebraico, ruach, ou grego, pneuma, descreve o ar em movimento e pode ser traduzido, além de "espírito", por outras expressões, como vento, brisa, sopro e respiração. De qualquer modo, relacionada a Deus, essa a palavra indica invariavelmente a força vital que gera mudanças, inspira profetas e capacita homens e mulheres a cumprirem papéis decisivos na história da salvação. No entanto, a presença do Espírito, no Antigo Testamento, possui caráter provisório. Ele age sobre a natureza e os indivíduos, mas nunca sobre todo o povo e sempre com finalidade específica. Por conta disso, cresceu a expectativa de que chegaria um tempo em que o Espírito seria derramado sobre toda a carne, e que sua manifestação contínua inauguraria uma nova época (cf. Ez 36.26-27; 37.1-14; Jl 2.28-32). A pregação de João Batista faz eco a essa esperança ao vincular o batismo com o Espírito Santo à figura do Messias prometido.

 

Não há dúvidas! Para os primeiros cristãos, Jesus era bem mais do que um simples profeta inspirado. Ele se distingue dos carismáticos de todos os tempos, que podem, sim, gozar da dádiva do Espírito, mas de forma temporária. Em contraste, o Novo Testamento é unânime em reconhecer que Jesus vive permanentemente na plenitude do Espírito. Enviado pelo Pai, Deus não lhe concede o Espírito "por medida" (Jo 3.34). De acordo com os evangelistas, todo o seu ministério - concepção, batismo, tentação, pregação, milagres, ressurreição - se desenvolve sob o signo do Espírito. Há perfeita sintonia, senão identificação, entre Jesus, enquanto Cristo, e o Espírito (cf. 2Co 3.17). Não causa, pois, surpresa que São João relate que, ao se despedir dos discípulos, o Senhor tenha prometido, não tirá-los do palco das tensões e conflitos onde o reinado de Deus se estabelece, mas enviar-lhes, da parte do Pai, o Consolador, o Espírito Santo, como o poder para testemunhar o evangelho em toda a parte (Jo 14.16-26; cf. Lc 24.49; At 1.8).

A efusão do Espírito, por ocasião da celebração de Pentecostes, demarcou as origens da igreja cristã de tal maneira que seria impossível dissociar, histórica e teologicamente, a constituição da comunidade de fé da presença eficaz do Espírito Santo. É na força do Espírito que as pessoas são despertadas para a fé e crescem na comunhão de Cristo; por sua ação, são chamadas e congregadas em um só corpo; por seus multiformes dons, são edificadas em amor; em função de seu poder, são capacitadas para o exercício de diferentes ministérios; graças à sua unção, a igreja sai de si mesma e se torna sinal da nova criação de Deus. Por volta do ano 180, o bispo Irineu de Lião, acentuou, de formar magistral, o elo entre a igreja e o Espírito na seguinte fórmula: "Onde está a Igreja, aí está o Espírito de Deus, e onde está o Espírito de Deus, ali está a igreja e toda a graça. E o Espírito é a verdade" (Contra as heresias, III, 24, 1).

Apesar da Igreja Primitiva experimentar com intensidade a ação do Espírito e viver sob seu influxo, como o ar que se respira, a reflexão sobre a doutrina do Espírito Santo se desenvolveu apenas no século IV, no contexto das controvérsias em torno da Trindade. O principal ponto era se o Espírito deveria ser considerado Deus ou não passava de mero atributo divino. Os argumentos foram ponderados com base nas Escrituras. Levou-se em conta que, na Bíblia, não somente os títulos dados a Deus se aplicam igualmente ao Espírito, mas também que as funções que lhe são especificamente assinaladas testificam a sua divindade, sem mencionar que, na liturgia do batismo, se invoca o "nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo" (cf. Mt 28.19). Ao final, a conclusão não poderia ser diferente da que foi formulada, em 381, no Concílio de Constantinopla, que reafirmou a fé no Espírito Santo como "Senhor e vivificador que procede do Pai; que, juntamente com o Pai e o Filho, é adorado e glorificado; que falou através dos profetas". Como fonte e doador da vida, cabia à pessoa do Espírito Santo a mesma dignidade e honra reservadas ao Deus Pai e Filho.

A teologia wesleyana se apropria dessa herança (cf. Artigos de Religião nº 4), contudo, não apenas formalmente. Em uma época em que a doutrina do Espírito Santo (não a sua presença, posto que não haveria vida cristã possível sem ela) parecia esquecida na Inglaterra, Wesley procurou expressá-la de modo visível e existencial. Assim, quando decidiu pregar ao ar livre aos pobres mineiros de Bristol, escolheu precisamente o texto com o qual nosso Senhor inaugurou sua missão em Nazaré, acrescentando em seu Diário, a observação: "É possível que alguém ignore que [esse texto] se cumpre em todo verdadeiro ministro de Cristo?". Ele estava convencido de que era o Espírito Santo, ou seja, o próprio Deus, quem agia por meio do movimento metodista, "para reformar a nação, particularmente a igreja, e espalhar a santidade bíblica sobre a terra". A boa vontade com que o povo simples acolhia a pregação e o demonstrava pelos frutos se constituía, para Wesley, em evidência irrefutável da aprovação divina. Diante disso, não demorou muito para que os metodistas fossem qualificados como entusiastas, acusação que Wesley prontamente respondeu alegando que os metodistas não reivindicavam possuir dom algum que não estivesse ao alcance de todas as pessoas que crêem em Cristo. "Nenhum de nós pretende ser guiado pelo Espírito Santo mais do que todo cristão pode estar..." [Um novo apelo aos homens de razão e religião, Parte I, V, 29].Em todo o caso, para ele, os sinais decisivos da manifestação do Espírito não eram os dons, que podem variar conforme a necessidade dos tempos e da missão, e sim a presença dos frutos (Gl 5.22-23), "a mente que houve em Cristo", a mudança interna e externa, enfim, a santidade de coração e vida - "o que ninguém pode negar que seja essencial a todos os cristãos em todos os tempos" [cf. Sermão 4: Cristianismo Bíblico, § 2-5].

Reafirmar nossa fé no Espírito Santo, por isso mesmo, é abrir-se ao mistério do Deus da vida que se comunica conosco e nos leva a clamar: vem, Santo Espírito, "fogo que tudo vivifica", renova nosso ser, transforma a igreja e a sociedade, e completa tua nova criação.

 

Rev.José Carlos de Souza,

professor da Faculdade de Teologia da Universidade Metodista de São Paulo


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