Publicado por Sara de Paula em Geral - 17/04/2020

Dia dos povos indígenas 2020 - confira o material da Pastoral Indigenista


Imagem: Sebastian Grochowicz | Unsplash

Xawara
Clique aqui para baixar em PDF

Não precisa ser profeta para saber o que Mauricio Waldman anunciou em “Para Onde Vamos?”.

Em decorrência da submersão de vastas zonas costeiras, dezenas de milhões de pessoas perderão suas casas, áreas de cultivo serão reduzidas e as fontes vitais de água doce serão salinizadas. Recorde-se que uma terça parte da população mundial habita zonas costeiras, até porque estas constituíram na escala do tempo histórico, o espaço que tradicionalmente garantiu as condições mais propícias à vida humana.

Por que haverá estas mudanças e catástrofes? Por que as desertização de grandes áreas? A questão da energia, a falta de água potável, etc.? Tudo é devido à urbanização das grandes cidades e a destruição das áreas verdes do mundo. Há uma necessidade urgente de envolvimento com a natureza.[1]

É necessário buscar conhecer a realidade indígena e nossa ancestralidade. Como pessoas politizadas, nós já conhecemos o mundo das metrópoles, hoje, porém, torna-se essencial conhecer a vida na floresta. Por exemplo, sobre minha ancestralidade, pesquisei as etnias indígenas remanescentes no Pará, as quais ainda sofrem pressão em seus hábitos e costumes, devido ao modelo econômico baseado no lucro, e no sistema econômico do lucro aplicado na Amazônia. Eu pensei nas lutas dos povos Parakanâ, Xipaya, Amanayé, Juruna, Gavião, Munduruku, Zo’e, HixKaryána, Mawayâna, Himarimã, Anambé, Karafawyá, Suruí, Apiká, Wayana-Apalai, Kuruáya, Apiaká, Karajá, Awareté, Guarani, Waiãpi, Akarôre, Katwena, Arara, Tembé, Kayapó, Wai-Wai, Guajá, Timbira, Araweté, Atikum, Twriwara, Kayabi, Kaxuyana, Tiriyó, Assurini, e muitos outros. Qual desses, espalhados pelas florestas e margens dos rios, como será a cultura e língua falada? Quantos estão sofrendo pelos agronegócios, mineradoras, usinas hidrelétricas e siderúrgicas? Poderíamos citar os povos originários do Brasil inteiro, que passam os mesmos dilemas.

Sabemos que antes da chegada dos europeus à América havia aproximadamente 100 milhões de índios no continente, e no território brasileiro, esse número chegava cinco milhões de nativos, aproximadamente. Atualmente, calcula-se que apenas 400 mil índios ocupam o território brasileiro, principalmente em reservas indígenas demarcadas e protegidas pelo Governo. São cerca de 200 etnias indígenas e 170 línguas. Porém, muitas delas não vivem mais como antes da chegada dos portugueses. O contato com o homem branco fez com que muitas tribos perdessem sua identidade cultural.

Em publicações anteriores, nos posicionamos quanto a demarcação de terras indígenas e lutas por direitos. As mudanças culturais são inevitáveis, especialmente, com a cultura indígena. Não apenas nome de homem branco está entrando nas culturas indígenas e ribeirinhas, também existe a influência da tecnologia, das drogas, etc. Enquanto isso está acontecendo, eles levam coisas ruins e tiram a riqueza de nossas terras. Vou transcrever parte de um texto por título “A visão dos índios”, sobre um depoimento do chefe Waiwai, líder do povo indígena Wayampí, que vive no Estado do Amapá.

“...Não é bom desmatar tudo... Depois os Wayampí pegarão tosse, muitos estarão doentes, pegarão gripe. E então os Wayampí irão morrer... Eles (brancos) poluem nossa água. Quando eles sujam nossas águas é ruim... Eles exterminaram a caça em nossa terra. Eles matam tudo. Acabam com os mutuns, acabam com os inhambus. Acabam com as cotias, veados, antas... Não quero que derrubem as árvores. Não quero. Onde ficarão as coambas? Não haverá guariba, nem preguiça. O que iremos comer? ...”.

Em 1990, Davi Kopenáwa Yanomámi, onde revelou a sua visão espiritual quanto a questão do minério extraído das reservas indígenas. Leia com atenção.

Nós chamamos essas epidemias de xawara... Agora sabemos da origem da xawara... Omame [criador da humanidade] mantinha a xawara escondida... nas profundezas da terra... Mas hoje os nabebe, os brancos, depois de terem descoberto nossa floresta, foram tomados por um desejo frenético de tirar a xawara do fundo da terra onde Omame a tinha guardado. Xawara é também o nome do que chamamos de booshike, a substância do metal, que vocês chamam ‘minério’... Quando o ouro fica no frio das profundezas da terra, aí tudo está bem. Ele não é perigoso. Quando os brancos tiram o outro da terra, eles o queimam, mexem com ele em cima do fogo como se fosse farinha. Isso faz saí fumaça dele. Assim se cria a xawara, que é essa fumaça do ouro. Depois essa xawara wakexi, essa ‘epidemia-fumaça’, vai se alastrando na floresta, lá onde moram os Yanomámi, mas também na terra dos brancos, em todo lugar. É por isso que estamos morrendo. Por causa dessa fumaça. Ela se torna fumaça de sarampo... Os brancos podem ser muito numerosos, eles acabarão morrendo todos, também... Quando essa fumaça chega no peito do céu, ele começa também a ficar muito doente, ele começa também a ser atingido pela xawara. A terra também fica doente. E mesmo os hekurabe, os espíritos auxiliares dos pajés, ficam muito doentes. Mesmo Omame está atingido. Deosime [Deus] também. É por isso que estamos agora muito preocupados... Quando não houver mais Yanomámi, aí o céu vai cair de vez...”.[2]

A cultura cosmológica indígena traz um ensino fundamental para a preservação do meio ambiente e da vida humana no planeta Terra. A ciência vai evoluir a cada dia, mas será que conseguirá controlar a autodestruição de nossa espécie? Nossos ancestrais tiveram a sabedoria de criar um sistema de preservação da natureza a partir da fé. Não é meramente superstição, nem religiosidade. É a resposta da natureza ao pecado da humanidade. Muitos não acreditam em seres espirituais, em Deus, ou espíritos da floresta, mas não importa, porém, nas cidades existirão as drogas, a violência, as doenças da alma, as epidemias, o corona vírus, outras maldições, consequências da maldade humana.

A crença da Xawara traz como essência, que sempre que o homem viola a natureza, são liberados espíritos e maldições, sejam para proteger ou para punir a humanidade. Essa crença é muito semelhante da descrição de Apocalipse 9, sobre a quinta trombeta:

O quinto anjo tocou a trombeta, e vi uma estrela caída do céu à terra. E foi-lhe dada a chave do poço do abismo. Ela abriu o poço do abismo, e subiu fumaça do poço, como a fumaça de grande fornalha, e, com a fumaceira saída do poço, escureceu-se o sol e o ar. Também da fumaça saíram gafanhotos para a terra; e foi-lhes dado poder como o que têm os escorpiões da terra, e foi-lhes dito que não causassem dano à erva da terra, nem a qualquer coisa verde, nem a árvore alguma e tão somente aos homens que não têm o selo de Deus sobre a fronte. Foi-lhes também dado, não que os matassem, e sim que os atormentassem durante cinco meses. E o seu tormento era como tormento de escorpião quando fere alguém. Naqueles dias, os homens buscarão a morte e não a acharão; também terão ardente desejo de morrer, mas a morte fugirá deles.[3]

Se já se cumpriu ou não a profecia de Apocalipse 9 não sei, nós, porém, seguimos nossa missão de preservação do meio ambiente. Isolamento social e ar para respirarmos. Para o bem do futuro da humanidade. Em alguns lugares do planeta, as únicas terras com florestas nativas preservadas estão em áreas indígenas. A natureza clama por socorro, a terra, a água, a fauna e a flora, gemem por preservação.

Pastor João Coimbra
Pastoral Indigenista
17 de abril de 2020


[1] “CULTURA AMAZÔNICA NA FORMAÇÃO TEOLÓGICA”, artigo como TCC no curso de Pós Graduação em Gestão e Docência do Ensino Superior, pela Universidade Luterana do Brasil.

[2] AZANHA, Gilberto; VALADÃO, Virginia Marcos. Senhores destas terras. Os povos indígenas no Brasil: da colônia aos nossos dias. São Paulo: Atual, 1991, pp. 63-69.

[3] Apocalipse 9.1-6, Bíblia de Estudo da Reforma, Almeida, Revista e Atualizada. São Paulo: Barueri: SBB, 2017.


Posts relacionados

Geral, por Sara de Paula

Época de cheias deixam desabrigados no Rio Grande do Sul

Confira como a Igreja Metodista se mobiliza para ajudar os moradores da cidade

Geral, por José Geraldo Magalhães

Geral, por José Geraldo Magalhães

Geral, por José Geraldo Magalhães