Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 04/05/2012

Artigo: Nossos pais adoravam nesse monte...

Adorar no monte, subir ao monte para orar tornou-se um  ato cativante e quase obrigatório para muitos cristãos.

Ao dialogar com a Samaritana Jesus ouve dela a expressão: "Nossos pais adoravam nesse monte”.  (Jo.4.19-23) Jesus replica-a afirmando que “dias virão em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade”.

Um dos atos fundamentais da fé cristã é adorar ao Senhor. Adorar é mais uma atitude interior do que exterior. Todavia, muitos hoje, vinculam o ato de adorar a “lugares quase sagrados”.

Gosto de ter  intimidade com Deus, de adorá-lo continuadamente. Um lugar distante, silencioso, para mim, pode ser de grande valia. Durante décadas, por ocasião das férias na praia, levantava às seis horas e ia caminhar visando  depois  subir numas pedras em Itanhaem (SP), onde ficava longo tempo em adoração e meditação. Muitas vezes fazia isso duas vezes por dia – no início e no final do dia.

Lembro-me quando pastor em Cunha, também em São Paulo, que está situada entre duas Serras, numa altitude elevada e com maravilhosa vista, que muitas vezes subia ao monte para adorar e orar. O silêncio, a vista contemplativa e o isolamento me cativavam.

Algumas vezes íamos em caminhada com um bom grupo da igreja local até  um “pico” de onde se tinha maravilhosa visão e um cruzeiro; lá celebrávamos...

Na época da Semana Santa, na madrugada do domingo de Páscoa, saíamos com o pessoal cantando músicas de ressurreição nas casas e bairros e no final, subíamos para a parte mais alta da cidade de onde celebrávamos com canto , alegria e vibração a Ressurreição de Jesus. Isso acontecia geralmente com o nascer do sol. Era algo radiante!

Tenho muita saudade dessa época e guardo na “retina de minha vida” esta cena e emoção, o gozo de uma eterna sensação. Sempre gostei da intimidade na comunhão com o Senhor e muitas vezes em locais onde a natureza é convidativa.

Jesus se retirava para os montes, algumas vezes vale, visando adorar, orar, por-se em comunhão com o Pai e descansar. Muitas vezes foi com os seus discípulos ao monte, retirando-se da multidão, ensinando-os e orando com eles.

Um dos textos mais significativos do Evangelho é o conhecido “Sermão da Montanha”, onde temos a essência dos ensinamentos de Cristo.

Estive duas vezes na Coréia onde dá-se grande importância à adoração e oração. Existem muitos acampamentos próximos de montanha, onde os fieis vão para orar. Há alguns lugares  bem preparados, com orientação, salas especiais, em montanhas maravilhosas. É uma significativa experiência!

Hoje fala-se muito em “orar no monte”. Um dia estando na Escola de Missões, no município de Teresópolis (RJ), na Primeira Região Eclesiástica, subi ao monte, onde hoje há um lugar especial de meditação, adoração e oração. Estando só, deitei-me no ponto mais alto de uma torre e fiquei a adorar, meditar e orar intimamente ao Senhor. Foi uma rica experiência!

Com  a ênfase dada em ir-se ao  “monte para orar”, algumas vezes chega-se a perder o sentido  da ida. O ir ao monte está ligado a uma autêntica atitude de adoração, meditação e oração íntima e comunitária. Todavia, muitos têm dado ao “monte” um destaque como um “lugar sagrado”. Se a pessoa não está no monte parece que falta algo, que não houve adoração e nem oração.

Corremos, se não tomarmos cuidado, de fazer do monte um “ídolo” dando-lhe um valor demasiado sagrado, que o próprio Jesus denunciou, pois devemos adorar em “espírito e em verdade”, intimamente.  Ao falar sobre a oração, Cristo nos disse: “Entra no teu quarto, fecha a tua porta, e no íntimo ora a Teu Pai...” (Mt.6.6)

Nas diversas religiões existem lugares sagrados, espaços sagrados, formas sagradas para orarem. Podemos, como cristão, de forma reverente ter as formas e atitudes as mais diferenciadas, sem contudo sacramentar umas e minimizar outras.

Lembro-me quando fui servir ao Exército e, ficando enfermo estive três meses e meio internado no Hospital Militar em São Paulo. Não me levantava e nem andava, passando todo o tempo deitado. Deitado eu lia, meditava, orava, adorava e tinha a minha intimidade com Deus. Fiquei até acostumado a essa posição para conseguir maior concentração. As pessoas enfermas e muito idosas adoram , oram  e meditam, em geral, na cama.

O(a) cristão(ã) carecem de vivenciar a “vida de piedade” através da leitura da Bíblia, da meditação, da oração, adoração e do colocar-se transparentemente diante  do Senhor. Assim devemos fazer diariamente e nos lugares mais tranquilos e inspiradores. Contudo, nem sempre conseguimos esses espaços, podendo entrar em comunhão com o Pai dirigindo, no trabalho de casa, e em diversas formas de atuar. O que não podemos é resumir a nossa  relação pessoal com Cristo a uma ida dominical à Igreja.

Um dia vi um grupo subir um monte para orar. De longe ouvia-se o grito dos que lá estavam, transmitindo mais uma atitude de desespero do que segurança no Senhor.

Israel  no seu espaço geográfico possuía significativo montes. Muitos deles tiveram importância na vida do povo. Porém, nenhum deles, diante da visão de Cristo, tornou-se um lugar sagrado, onde de forma mais significativa Deus se revelava. Houve, sim, no período inicial do povo de Israel, momentos em que Deus entregou a Moisés, no Monte, a Lei. Quando Moisés decidia falar com Deus, ia ao monte. Para ele ali era um lugar sagrado.
Houve também o questionamento dos “altos montes” onde estavam os “balaains”, e se oferecia nas árvores frondosas culto aos “deuses” através das sacerdotisas prostitutas. Os profetas condenam veementemente a ida aos montes.

Creio que devemos continuar indo ao monte, em especial os que gostam dessa atitude , mas tomando o cuidado de não fazer dele um “lugar sagrado”, onde temos “maior segurança” do que outros lugares. Se isso acontecer estaremos edificando um “novo ídolo”, o que contraria ao Pai.

Jeremias combateu a “falsa segurança” e a “idolatria do templo”, pois o povo andava de forma irregular, não obedecia e nem seguia as leis divinas e nem o adorava de coração. Mas, quando chegava no templo diziam: ”Templo do Senhor... Templo do Senhor... Templo do Senhor é esse!” Aqui estamos seguros e salvos. Isso não era verdade... (Jr. 7.1-15). É bom estar no templo. Louvar, adorar, confessar, edificar-se com a Palavra, viver na Unidade do povo, estar juntos e tendo tudo em comum, sendo soliddários. Mas isoladamente o templo nada representa, por maior, mais lindo e inspirador que seja, pois “Jesus é  maior do que o Templo”. Israel  está até hoje sem o templo e não é por isso que perdeu a sua vivência de comunhão com Deus, segundo a sua maneira de ver e ser.

Sim, “Jesus é maior do que o Templo!, do que “o monte”, do que “as pedras do mar” e os lugares mais lindos, pois  isoladamente nada disso tem significado, nem Jerusalém, nem em Samaria, nem a Palestina, ou os lugares sagrados de Israel, por mais históricos e inspiradores que sejam.

Tudo deve existir em função de Cristo e de adorar ao Pai em “espírito e em verdade”, sob a inspiração e unção do Espírito Santo. 

Nelson Luiz Campos Leite

Bispo Honorário da Igreja Metodista

 


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