Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 26/05/2011

Abdias do Nascimento: Brasil perde pioneiro na militância contra o racismo

O Brasil perdeu na terça-feira, 24 de maio, um de seus maiores líderes: Abdias do Nascimento, um dos pioneiros na luta contra a discriminação racial. Aos 97 anos, o ativista na denúncia do preconceito e na defesa dos direitos dos afrodescendentes pelo mundo não resistiu às complicações cardíacas que o levaram a uma internação no último mês, no Rio de Janeiro.

Abdias deixa muitos seguidores inspirados em sua trajetória de coragem e dedicação aos direitos humanos. O corpo de Abdias do Nascimento será velado na quinta e na sexta-feiras, 26 e 27, na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro. O corpo será cremado e a intenção da família é de que as cinzas sejam jogadas na Serra da Barriga, em Alagoas, onde foi fundado o Quilombo dos Palmares.

Nascido em 1914 no município de Franca, Estado de São Paulo, Abdias foi filho de Dona Josina, a doceira da cidade, e Seu Bem-Bem, músico e sapateiro. Com uma trajetória marcada pelo ativismo, Abdias conseguiu importantes resultados de suas iniciativas na defesa e na inclusão dos direitos dos afrodescendentes brasileiros, principalmente, por meio de políticas públicas. Por exemplo, em 1988, Abdias tornou-se um dos responsáveis pela instituição da Comissão do Centenário da Abolição e por seu desdobramento na Fundação Cultural Palmares.

Como primeiro deputado federal afro-brasileiro (1983-1987) e como senador da República (1991, 1996-1999) dedicou seus mandatos à luta contra o preconceito. Foi responsável por projetos de lei que definiam o racismo como crime e pela criação de mecanismos de ação compensatória para construir a verdadeira igualdade para os negros na sociedade brasileira.

Admiradores manifestaram seu pesar e prestaram homenagens:

“Como diz um provérbio africano, de matriz banto: Assim quando morre uma árvore, morre uma floresta, quando morre um ancião (ou anciã) morre uma biblioteca. A vida de Abdias representa um compêndio de ensinamentos de luta e resistência pela dignidade do povo negro em sua diáspora brasileira. Muito do que colhemos, hoje, em termos de ações afirmativas e de políticas públicas compensatórias, tiveram na sua luta, presença e efetiva participação política, contribuições inestimáveis. Que junto com o Rev. Matim Luther King, a ativista evangélica Rosa Parks, e o Almirante negro João Cândido que encontrou na fé cristã e na Igreja Metodista, ao final de sua vida guerreira e navegante, um porto seguro; encontre também, no panteão de homens e mulheres que lutam contra todas as formas de racismo e de discriminação, perpétua gratidão e memória.”  Bispo Luiz Vergílio – 2ª Região Eclesiástica – Igreja Metodista

“A morte de Abdias Nascimento nos traz à memória a figura de  um profeta, de uma sábio, de um político, de um intelectual que  viveu para confrontar os poderes  sociais, religiosos e culturais  dominantes e contrários ao povo negro. Sua passagem por esta vida trouxe esperança e novos horizontes para todos/as nós. Ele sai deste mundo com dignidade  e com o reconhecimentos de milhares de pessoas que choram e se fortalecem pelo exemplo deste grande mestre. Diná da Silva Branchini: Pastoral Nacional de Combate ao Racismo, Ministério AA-AFRO-3RE, da Igreja Metodista no Brasil
 
“Tomba mais um irmão. Oxalá que inspiremos as novas gerações como ele nos inspirou. Que o Pai das luzes o receba no grande KILOMBO e console os que mais o amaram!”
Roberto Loiola – Coordenador da Pastoral de Combate ao Preconceito Racial, da 5ª Região

“Fiquei muito triste, quando tomei conhecimento da morte do meu querido mestre e companheiro de lutas culturais e políticas desde o início dos anos 60. Eu era ainda muito jovem e o Abdias já era bem adulto e, junto com Solano Trindade, nos dava aulas sobre a cultura negra e, acima de tudo, nos dava um testemunho sobre a necessidade de não calarmos diante da tirania e da opressão. Depois, anos mais tarde, em 1974, nos reencontramos nos Estados Unidos onde ambos estávamos exilados. Continuamos lá a nossa luta contra a ditadura brasileira, mobilizando apoios entre as igrejas, intelectuais e organizações do movimento pelos Direitos Civis. Depois que ambos regressamos ao Brasil ainda nos encontramos várias vezes em sua residência no bairro da Glória, no Rio. Desde há alguns anos, com a saúde e o físico debilitado, Abdias já não tinha mais as mesmas forças para lutar, mas sempre demonstrava o mesmo fervor e a mesma profundidade de seu compromisso pela luta contra o racismo no Brasil e no mundo. Estou triste, muito triste por não poder ir ao Rio despedir-me dele juntamente com todos os seus amigos e amigas. Tenho certeza de que seu espírito de luta renascerá em todos nós. Anivaldo Padilha


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