Publicado por José Geraldo Magalhães em Pastoral Indigenista, Destaques Nacionais - 29/09/2013
A Constante Vitória da Morte Sobre a Vida
"Promover o discipulado na perspectiva da salvação, santificação e serviço" (nossas ênfases)
Cada dia que se passa a banalização da vida aumenta. Conta a minha mãe que na cidade de Juiz de Fora/MG em que ela e seus pais moravam, meu avô era um policial, e na cadeia durante anos havia apenas um preso.
Lembro-me ainda que quando era criança e morávamos com nossos avós, era muito, mas muito raro ouvirmos falar em homicídios, agressões, assaltos, abusos de qualquer espécie. Claro que não sou tão ingênua a ponto achar que eles não aconteciam, mas estão se tornando tão rotineiros que parece que perdemos o controle de tudo que a que nós cristãos anunciamos - a vida em Cristo Jesus, que é dirigida a todos indistintamente e não tem tido a força necessária para impedir esta constante vitória da morte.
Em João 14.1-15, quando Jesus fala aos seus discípulos, busca instrui-los e afirma sua presença com eles. Ele lamenta na afirmação feita a Felipe (V.8),_ "Há tanto tempo estou convosco e não me tens conhecido?" Essas palavras de lamento de Jesus me vieram à mente ao assistir os jornais na TV, onde quase todas as notícias giram em torno da morte - Mãe e quatro filhos são encontrados mortos; mãe mata as duas filhas; ao ser confundido com assaltante, o entregador de pizza é assassinado; dois policiais e um traficante são mortos na favela, bala perdida mata criança, e por aí vai...
O que me chamou a atenção foi uma frase pichada numa das casas em uma destas reportagens: "EM SÃO PAULO NÃO EXISTE AMOR". Nesse momento o telefone de nossa casa toca, pois ainda me encontro de repouso depois de um acidente no dia 13/09; do outro lado era Ronaldo, nossa pessoa de referência dentro da comunidade indígena, e ele diz:
Pastora o Edimilsinho foi morto e jogado na represa. Ou então ele estava bêbado e caiu e se afogou. O Corpo de Bombeiros está tirando o corpo dele neste momento.
O Edimilsinho era um alcoólatra, mas mesmo quando estava bêbado tinha um sorriso que me parecia ver nele o gosto e desejo de viver. Quando passávamos por ele pelas estradas da aldeia era comum encontrá-lo deitado a beira do caminho e às vezes tínhamos que tirá-lo e colocá-lo em uma sombra. Outras vezes nos cumprimentava erguendo a mão bem alta. De longe já o conhecíamos pelo seu jeito singular de andar, nos lembrava uma modelo desfilando.
Certo dia, antes de nossa reunião cúltica, num início de noite ele passava embriagado e algumas crianças começaram a mexer com ele, então de posse de um facão ele corria atrás dos meninos e quando vi o que ocorria ele correu em minha direção, talvez me confundido com um das crianças por causa do meu tamanho então gritei:
Dimilsinho! Dimilsinho! É a pastora! É a pastora! Imediatamente ele parou e veio andando em minha direção, pegou na minha mão e beijou e tentando me abraçar dizia:
As crianças estão mexendo comigo!
Neste momento passa em nossa mente a lembrança do lamento de Jesus, "Há tanto tempo que estou convosco e ainda não me conheces?" E nos bate uma incapacidade de mostrar aos sofredores a vida que Jesus traz! Mas ao mesmo tempo somos motivados pelo mesmo Cristo: "Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize" (Jo.l4. 27 ).
Existem ainda muitos outros Dimilsinhos, Marias, Ricardos que precisam conhecer em forma de serviço o amor de Deus, que está em Cristo e que excede a toda compreensão humana, por isso somos convocados a continuar no exercício de apresentar essa vida.
Revda. Ima Costa
Pessoa de Referência Nacional para a Questão Indígena